terça-feira, 6 de agosto de 2013

“Onde está Murilo?”

Mãe goiana procura filho
desaparecido há 8 anos

Antéro Sóter

A população está acompanhando, através dos noticiários, as manifestações que estão acontecendo, em especial no Rio de Janeiro e em São Paulo, cobrando das autoridades do Rio o esclarecimento sobre o que ocorreu com o pedreiro Amarildo de Souza, desaparecido há 23 dias. Em Goiás, a dona de casa Maria das Graças Soares luta quase que sozinha, há oito anos, para saber o paradeiro de seu filho Murilo Soares. O garoto é umas das 39 pessoas que, segundo organizações sociais de defesa dos direitos humanos, desapareceram após serem abordadas por policiais militares na região metropolitana de Goiânia nos últimos anos.

"Eu também queria saber onde está o meu filho. Eu queria que os governantes, as autoridades, também me ajudassem”, disse Maria das Graças. “São 39 famílias de desaparecidos após abordagem policial que até hoje não tiveram respostas”, comentou a dona de casa, referindo-se aos números parcialmente revelados no ano passado, em um relatório da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Goiás.
“Minha vida virou uma tristeza, um inferno, e minha única esperança é encontrar meu filho. Batalho, continuo correndo atrás para um dia encontrá-lo, mas o pouco que eu posso fazer é dar entrevistas para que o caso não seja esquecido e participar de reuniões de grupos de direitos humanos”, comentou Graça, citando, como exemplo, a reunião extraordinária do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), da qual a ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, participou, em setembro do ano passado.
AMARILDO
Morador da Rocinha, Amarildo desapareceu no dia 14 de julho deste ano, após ser levado por policiais militares para a Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da comunidade, no bairro de São Conrado, na zona sul do Rio. O caso gerou protestos de moradores da Rocinha aos quais, depois, se somaram outros segmentos da sociedade fluminense. Após chegar às redes sociais, a pergunta "Onde está Amarildo?" atraiu a atenção da imprensa brasileira e internacional. Já o caso de Murilo e das outras 38 supostas vítimas da abordagem policial goiana atraem cada vez menos atenção da opinião pública.
MURILO

Murilo tinha 12 anos quando, em 22 de abril de 2005, policiais do grupo Rondas Ostensivas Táticas Metropolitanas (Rotam) pararam o carro dirigido pelo servente Paulo Sérgio Pereira Rodrigues, de 21 anos. A pedido do próprio pai (que, na época, já estava separado de Graça), Murilo voltava para casa de carona com Paulo. Várias pessoas presenciaram o momento em que os policiais revistavam o motorista enquanto o garoto permanecia de pé, ao lado do veículo. Foi a última vez que Murilo e Paulo foram vistos. O carro foi encontrado no dia seguinte, carbonizado e sem a aparelhagem de som e as rodas. Os corpos dos dois ocupantes, no entanto, jamais foram localizados. Paulo tinha antecedentes criminais.
Oito policiais acusados de latrocínio (roubo seguido de morte) e ocultação de cadáver foram absolvidos pela Justiça de Goiás por falta de provas materiais. O Ministério Público recorreu da sentença e o resultado do julgamento foi anulado pela Justiça estadual, que decidiu levar os policiais ao Tribunal de Júri por duplo homicídio qualificado e ocultação de cadáveres. Por falta de indícios, a nova decisão também foi anulada e o novo julgamento não aconteceu.
IMPUNES
Passados oito anos, Maria das Graças diz ter perdido a esperança de que alguém seja punido pelo sumiço de seu filho. Por já não acreditar que o garoto esteja vivo, ela diz alimentar unicamente a esperança de dar um enterro digno ao seu filho. “Minha expectativa é que um dia eu possa enterrar os restos do meu filho. Este é meu sonho. Eu quero encontrar o Murilo, não importa o jeito que ele esteja”.
Informações desencontradas, expectativas frustradas, ameaças de morte, o contato com a burocracia e a “falta de sensibilidade” do Estado levaram a dona de casa Maria das Graças Soares a acreditar que ninguém será punido pelo desaparecimento do filho, Murilo Soares. Dia 22, quando o desaparecimento do adolescente completou oito anos, Graça declarou que o que a sustenta é o desejo de localizar o corpo do filho e enterrá-lo dignamente. “Acabaram com a minha vida”, disse Graça.
“Infelizmente, de lá para cá, nada aconteceu”, lamentou Graça. Há pouco mais de dois anos, o Instituto Médico-Legal (IML) de Goiânia fez exames para verificar se uma ossada, supostamente de um adolescente, era de Murilo. “Disseram que o resultado ia demorar uns seis meses, mas, até hoje, nunca tive uma resposta se o exame deu positivo ou negativo. Já fui lá e não me deram resposta”. O advogado Alan Hahnemann Ferreira, que hoje representa Graça, disse estar tentando obter uma resposta oficial do IML. Mas, segundo ele, extraoficialmente a informação é que a ossada não seria de Murilo.
“A exceção de alguns veículos impressos, e muito por iniciativa de uns poucos jornalistas, a mídia local tem um receio enorme de tratar desses temas. Aí, sem isso, fica uma briga de Davi contra Golias. Com certeza, sem essa atenção, não há a necessária mobilização da sociedade. Logo, não há pressão pela resolução desses casos”, disse o advogado.
Ao pedir que a investigação e o julgamento das mortes de moradores de rua de Goiânia fossem federalizados, a ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, sugeriu, a cerca de três meses, que também as denúncias de desaparecimentos após abordagens policiais na região metropolitana da capital goiana também fossem federalizados. O pedido da ministra foi encaminhado ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, no começo de maio.
No pedido, é mencionada a suspeita de violência policial e atuação de grupos de extermínio em Goiás que, desde 2000, resultaram em “sistemáticas violações aos direitos humanos, diante da inércia estatal para investigar, julgar e punir os possíveis autores”.

A cargo do ministro Jorge Mussi, do STJ, o deslocamento da competência ainda não foi julgado. Por meio do chefe de Comunicação Social, coronel Anésio Barbosa Júnior, a Polícia Militar de Goiás informou que acompanha os desdobramentos do caso, classificado como “extremamente complexo”, e tem o maior interesse no esclarecimento dos fatos para que, se comprovadas as acusações, os eventuais responsáveis sejam punidos. Ou que, caso contrário, não restem dúvidas sobre a atuação de quaisquer servidores públicos ou da corporação. (Com Agência Brasil)





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