Evite a automedicação. Pode piorar
Antero Sóter
A automedicação é, e sempre foi, uma mania em todas as camadas sociais,
mesmo com a mídia e as autoridades alertando quanto aos perigos desta prática.
A qualquer sinal de dor de cabeça, ocasional ou frequente, as pessoas correm ao
armário em busca de um analgésico qualquer, na maioria das vezes indicado por
um parente ou amigo. Um ato, de acordo com especialistas, danoso à saúde e que
pode, inclusive piorar as crises, já que o uso indiscriminado de analgésicos,
ao invés de aliviar o sintoma, pode agravá-lo. O alívio, quase que imediato
causado por tais medicamentos, quando usados sem prescrição médica após uma bateria
de exames, cobra seu preço levando a um aumento na frequência de crises.
Segundo o neurologista Leandro Teles, formado e especializado pela
Universidade de São Paulo, “existe uma multidão de pessoas que tem dor de
cabeça quase todos os dias e vivem a base de analgésicos. O ideal, nesses casos
é iniciar um tratamento preventivo, mudança de estilo de vida e cessar o uso
abusivo de tais medicamentos”.
Os analgésicos simples, de acordo com Leandro, são direcionados para
doenças agudas ou para pessoas com crises de dor de cabeça eventuais. “Quando a
pessoa tem mais que duas crises de dor de cabeça forte por mês, já está
indicado o tratamento preventivo. O uso excessivo de analgésico transforma uma
enxaqueca eventual em uma enxaqueca crônica, com frequência muito elevada de
crises, por vezes todos os dias. Para saber se você usa analgésicos demais
bastar contar o número de comprimidos usados em uma semana, se for mais que dois,
você está fazendo mais mal do que bem à sua saúde” orienta o especialista.
O neurologista paulista ensina que o tratamento correto de dores de
cabeça frequentes exige um diagnóstico preciso do tipo de dor, que pode ser do
tensional, causado pela tensão do dia a dia e que são mais leves, constantes,
bilaterais, “aperto e sem sintomas de náuseas”, e a enxaqueca, “que apresenta
dores mais intensas, pulsáveis, lateralizadas, com intolerância à luz, cheiro e
ruídos, acompanhada de náuseas
Para Leandro Telles, em qualquer uma das situações, quando a frequência
de crises mensais é alta, o tratamento preventivo (com medicamento usado
diariamente, escolhido pelo neurologista e em dose baixa) é mais eficiente. “Correr
atrás da dor com analgésicos causa uma espécie de efeito rebote tirando o
quadro de controle. Quando a pessoa se dá conta, está com um monte de remédios
na bolsa e usando analgésico diariamente. O mesmo remédio que alivia um pouco o
sofrimento gera o retorno precoce da dor. Algo semelhante ocorre com alguns
descongestionantes nasais, você pinga, o nariz abre, depois o nariz fecha, aí você
pinga de novo e o ciclo se repete por meses e até anos. (mais um exemplo de
efeito medicamentoso rebote)”, diz ele.
Para Leandro Teles, “não tem jeito, para tratar dores de cabeça crônicas
e frequentes o ideal é procurar profissionais habilitados. O diagnóstico
preciso, o mapeamento da dor, mudanças pontuais de estilo de vida e escolha de
medicamentos apropriados para cortar ou prevenir a dor, quase sempre confere um
alívio mais duradouro do martírio causado pela dor de cabeça”.
O que te dá dor de cabeça?
O neurologista
Leandro Teles afirma que “grande parte das dores de
cabeça crônicas são determinada por aspectos genéticos e exacerbada por
aspectos ambientais. Como ainda não podemos mudar o código genético, nos resta
tentar mudar o estilo de vida dessas pessoas”. Segundo ele, existem
inúmeras causas e tipos de dor de cabeça.
“O tratamento da dor de cabeça crônica é um
processo que nasce de um diagnóstico preciso, compreensão do contexto de vida
do paciente, mapeamento dos sintomas (diário de dor), mudanças de estilo de
vida e, eventualmente, medicamento preventivo”, explica o
neurologista.
Leandro Teles aponta alguns hábitos que podem gerar dor em
pessoas com enxaqueca e dor de cabeça tensional.
1- Sedentarismo
Esse é um erro comum de quem tem dor de cabeça frequente.
Inúmeros estudos já demonstraram os benefícios da atividade física regular na
redução da frequência e intensidade de crises de dor de cabeça. O ideal é a
atividade aeróbica, que dê prazer ao praticante (seguir gostos pessoais) e com
regularidade. Além de um controle direto das dores, a atividade melhora o sono,
controla a ansiedade, o peso e a saúde como um todo.
2- Privação
de Sono
Isso não é nada recomendado para tem predisposição à dor de
cabeça. O ideal é manter cerca regularidade de horário, dormir continuamente e
pelo menos entre 6 e 10 horas por noite (a depender da necessidade individual).
Quando for inevitável a privação é fundamental descansar bastante antes da
noite em questão e dar opção ao corpo de descansar um pouco a mais na manhã
seguinte. Outro problema quem tem dores de cabeça é dormir demais, isso mesmo,
dormir muito também causa dor. Por isso a dica é a regularidade.
3- Ficar
muito tempo sem comer
Erro clássico. As pessoas estão sempre no corre-corre,
resolvendo problemas do dia-a-dia e se esquecem dessa medida simples e muito
importante: se alimentar em intervalos regulares. Quem tem enxaqueca ou
cefaleia tensional pode desencadear uma crise por essa privação glicêmica. A
dica é manter pequenas porções, várias vezes ao dia. Evite ficar mais de 4
horas sem comer alguma coisa, pode ser uma refeição, um lanche, uma fruta ou
mesmo uma barra de cereais.
4- Alimentação
Inadequada
Algumas pessoas são sensíveis a alguns alimentos, manifestando
dor de cabeça após esse consumo. Os mais comuns, no caso da enxaqueca são:
chocolate ao leite, queijos amarelos, embutidos, condimentos e temperos. Eles
podem conter substâncias que alteram o calibre dos vasos dentro da cabeça,
precipitando uma crise (são ricos em tiramina, cafeína, sulfitos, nitratos,
etc.). O ideal é ficar bem atento, só retire da dieta se houver uma associação
consistente. Atente também para laticínios (muitas pessoas são intolerantes),
fast food, refrigerantes, etc. Neste quesito cada paciente precisa se conhecer
muito bem evitar dietas padronizadas sem evidência de associação.
5- Stress
do dia-a-dia
Isso sim é uma bomba-relógio. A sobrecarga de trabalho, acúmulo
de tarefas, pressão emocional, etc., tudo isso coopera com elevação na taxa de
crises de dor de cabeça. Como é impossível eliminar todos os fatores
estressores da nossa rotina, a dica é tentar minimizar esses momentos e abusar
de medidas anti-stress (atividades de relaxamento, sociais, lazer, atividade
física, férias, etc.).
6- Consumo
Álcool
As bebidas alcoólicas podem gerar dor de cabeça tipo tensão e
agravar enxaqueca. Isso pode ocorrer desde poucos minutos após sua ingesta
(efeito vasodilatador e neurotóxico do etanol) até um dia após (efeito de
desidratação da ressaca). Quem tem predisposição a crises de dor de cabeça deve
ter muito moderação e cuidado com uso do álcool. No caso específico da
enxaqueca, ocorre uma sensibilidade maior ao vinho tinto, que além do álcool contém
tiramina (uma substância que altera os vasos).
7- Abuso
de Medicamento Analgésico
Consumir muito analgésico causa mais crises de dor. Parece
paradoxal, mas é isso mesmo. O analgésico comum pode ser usado para crises
muito eventuais, no máximo duas vezes na semana. Acima disso, considera-se
abuso, pois ele precipita a dor de cabeça rebote. O medicamento em excesso faz
com que as crises retornem com uma frequência cada vez maior, podendo aparecer
até todos os dias. Para evitar isso é fundamental procurar ajuda especializada
e iniciar um tratamento mais adequado e personalizado.
8- Doenças
descompensadas
Uma série grande de doenças clínicas descompensadas pode causar
ou piorar crises de dor de cabeça. Entre as principais estão: fibromialgia,
problemas de coluna cervical, depressão, ansiedade, problemas na tireoide,
insônia, disfunção de ATM, bruxismo, etc. Pode isso, é fundamental manter a
saúde em dia e atentar para a compensação de outras patologias que possam estar
associada à dor de cabeça. Para tal, é importante o seguimento médico regular e
uma abordagem clínica abrangente.
9- Oscilação
hormonal
A queda ou a elevação do estrógeno são importantes
desencadeadores de dores de cabeça. A montanha russa hormonal que as mulheres
em idade fértil passam as torna muito mais sensíveis às dores de cabeça. Por
isso que a enxaqueca é três vezes mais comum em mulheres do que em homens. O
período de maior risco é o pré-menstrual, aonde o estrógeno despenca, mas podem
ocorrer crises durante ou mesmo logo após a menstruação. É fundamental checar
se sua dor de cabeça tem esse padrão e comunicar ao seu ginecologista e seu
neurologista de confiança.
10-Exposição
solar excessiva
A exposição excessiva à luz solar, seja em tempo, seja em
intensidade, pode causar desde desconforto leve até fortes crises de enxaqueca.
O calor é vasodilatador, além disso, a exposição luminosa intensa pode
precipitar crises. No verão, é muito comum haver piora das crises, por viagens,
alteração do ritmo de sono e alimentar, excesso de álcool e aumento da
exposição solar.
ENXAQUECA
O
neurologista Leandro Teles explica que “a enxaqueca é uma dor de cabeça muito peculiar, o diagnóstico preciso
é fundamental, pois o tratamento é direcionado e pode ser bem diferente do feito
para outros tipos de dor. Estamos falando de uma doença
relativamente comum, cerca de 30% das mulheres em idade fértil e 10 % dos
homens apresentam esse tipo específico e incapacitante de dor na cabeça”.
As características clássicas da crise de
enxaqueca, segundo ele, podem ser explicadas através de vários fatores.
1- Evolução
= a enxaqueca
evolui em crises. A pessoa, de tempos em tempos, apresenta o sintoma – a
duração da crise é de 4 a 72 horas (se não medicada). Entre as crises a pessoa
está bem. É fundamental pelo menos cinco crises na vida para o diagnóstico e
evidências que o problema é crônico.
2- Característica
da dor = de
intensidade moderada a forte, geralmente de uma da cabeça (apenas de 40 % das
vezes dói os dois lados), característica pulsátil (latejante, como se o coração
batesse dentro da cabeça), que piora com atividades do cotidiano (melhora com
repouso).
3- Sintomas
associados = além
da dor, o paciente costuma sentir intolerância à luz, ao barulho e,
eventualmente, a odores fortes. É muito frequente a presença de náuseas e até
vômitos (o que dificulta a tomada de remédios). Em cerca de 20% dos casos de
enxaqueca podem surgir sintomas neurológicos transitórios antes, durante ou
depois da dor. Esses sintomas são geralmente visuais, como pontos brilhantes ou
visão turva, mas podem ser formigamentos e até bloqueio da fala (chamamos esse
sintoma de aura, e são absolutamente típicos da enxaqueca).
4- Afastar
outras doenças = é
fundamental afastar outras doenças importantes na hora de dar o diagnóstico de
enxaqueca. Para isso o médico usa toda a sua experiência e o exame neurológico,
em casos mais complicados podem ser necessários exames complementares (guiados
para afastar outras causas, uma vez que a enxaqueca não aparece nos exames).
Várias doenças podem simular dores de cabeça mais crônicas, tais como: trombose
venosa cerebral, meningite crônica, hipertensão intracraniana, sinusopatia,
etc. (por isso nada de auto-diagnóstico)
5- Complicações
= a enxaqueca mal
conduzida pode complicar, sendo as duas principais complicações: 1- Estado de
mal de enxaqueca = é quando a dor dura mais que 72 horas, muitas vezes
necessitando de internação e medidas mais drásticas; 2- Enxaqueca transformada:
algumas vezes a enxaqueca sai do controle e começa a aparecer quase todo o dia.
Fica um pouco mais fraca mais não vai mais embora (a principal causa para isso
é o uso excessivo de analgésicos comuns – acima de duas vezes por semana).
“Aa enxaqueca é uma síndrome complexa.
Envolve a cabeça, intolerância a estímulos, alterações de estômago e até
sintomas neurológicos focais. Além disso, tem doenças sérias que podem simular
uma enxaqueca descontrolada, atrasando muito o diagnóstico correto. Por fim, o
tratamento incorreto pode levar à complicações como a dor de cabeça crônica
diária, que causa profundos impactos físicos, sociais e emocionais a quem já
experimentou essa complicação”, informa Leandro Teles.
Por tudo isso, segundo ele, é fundamental
dar atenção ao sintoma e buscar ajuda especializada. O tratamento correto
inclui mudanças personalizadas no estilo de vida, escolha de medicamentos
preventivos em casos selecionados e definição da terapia anti-dor caso, ainda
assim, ela apareça. Os resultados são muito bons quando damos a devida atenção
a essa incapacitante doença. (Com Sacha Silveira_Assessoria)