quarta-feira, 14 de outubro de 2009

ASSASSINATOS DE REPUTAÇÃO

As autoridades abusam, você paga

Por Carlos Brickmann em 12/10/2009


Houve o caso da Escola Base, um clássico de abusos das autoridades, com a feroz colaboração da imprensa; e, quase tão famoso, o caso do Bar Bodega, que agora chega a uma conclusão, com a condenação do Estado a indenizar o acusado preso injustamente, pela acusação fabricada de assalto e assassínio.

O caso ocorreu em 1996. Foram 13 anos de luta judicial, portanto. O Bar Bodega, em São Paulo, foi assaltado. Dois clientes foram mortos. Alguns suspeitos confessaram, depois de "habilmente interrogados"; e ficaram presos preventivamente até que os verdadeiros assaltantes e assassinos foram encontrados.

Um dos acusados, que além de ficar preso perdeu o emprego, moveu processo contra o Estado, por prisão indevida. Embora a prisão preventiva tivesse sido decretada pela Justiça, o Supremo Tribunal Federal decidiu que há "responsabilidade civil objetiva da entidade estatal". O voto do ministro Celso de Mello está aqui.

O caso é importante: pode colocar um freio no hábito de punir o cidadão, antes que qualquer tribunal se manifeste, com o espetáculo da detenção, devidamente documentado pela TV, mais a privação da liberdade por um longo período, com as penas acessórias, sempre impostas à revelia dos processos judiciais legais, de prejuízos materiais elevados e destruição de reputação. Importante: embora, no caso do Bar Bodega, tenha havido denúncias de tortura, não houve como comprová-las. A obrigação de indenizar foi decidida pela prisão do inocente, não por eventuais torturas que tenha sofrido.

É fato, também, que as irregularidades foram cometidas por agentes do Estado, enquanto a conta cairá nas costas do contribuinte – nas suas costas, caro leitor, caro colega. É uma distorção que precisa ser corrigida, para que a conta recaia em quem cometeu os abusos, e não apenas sobre quem paga seus salários. Outra distorção que precisa ser corrigida é a leniência com que se observa, nesses casos, o papel dos meios de comunicação: quem colabora com os abusos deve também responder por isso.



A lembrar

É definida, em lei, a duração máxima da prisão a que um suspeito pode ser submetido. Esta duração vem sendo sistematicamente ignorada. Os presos podem ser esquecidos por muito tempo sem julgamento – e isso é tão nocivo, para o correto funcionamento da sociedade, quanto assassinos confessos e condenados que ficam em liberdade.



Kafka é aqui

Nesse tipo de caso que o Supremo Tribunal Federal acaba de condenar, a passividade da imprensa é espantosa: a defesa padrão, quando se comprova que errou feio, sempre contra os inocentes, é dizer que apenas transcreveu o que disseram as autoridades. Em resumo, confessam que erraram por confiar nas autoridades, quando sua obrigação é desconfiar sempre.

Há pouco tempo, no Rio Grande do Sul, o Ministério Público Federal concedeu entrevista coletiva para comunicar que havia denunciado a governadora do estado, deputados federais e deputados estaduais por improbidade administrativa. Entretanto, não informou quais eram as acusações, alegando "segredo de Justiça". O segredo de Justiça existe, está na lei; só que se refere a casos de segurança nacional ou que envolva direito de família, principalmente nos casos de proteção a menores. E processar alguém sem que se diga o motivo rendeu um livro famoso, de Franz Kafka: chama-seO Processo. Hoje,O Processo virou coisa comum. A imprensa aceita, divulga e bajula os acusadores. E não mostrou sequer o ridículo de uma entrevista coletiva cujo objetivo era negar informações.



Ameaça privada

A viúva de um dos passageiros do Boeing da Gol que caiu após o choque com um Legacy tripulado por dois americanos entrou com um processo contra Joe Sharkey, o jornalista que estava a bordo do jatinho e que é uma das principais testemunhas do acidente. Estranhíssimo: Sharkey é tão vítima do choque aéreo, embora tenha sobrevivido a ele, quanto o marido da senhora que o processa. Era passageiro, não pilotava o avião, não fazia parte da tripulação. Só há uma explicação para o processo: a antiga mania de culpar os porta-vozes pelas más notícias que trazem.

E, cá entre nós, acusar Sharkey de atentar contra a honra do Brasil por ter supostamente dito (ele nega) que somos tupiniquins e atrasados é de doer. Joelmir Beting, sobre cuja ligação com o Brasil não pode pairar a menor dúvida, é um dos que mais se referem às coisas brasileiras como tupiniquins. A candidata Dilma Rousseff também usou a expressão outro dia, para se referir a alguma manifestação de atraso. E quem disse que chamar os brasileiros pelo nome de uma de suas famílias indígenas é ofensivo? No caso, parece mais é preconceito.



Ameaça pública

Na Argentina, quem ameaça a imprensa de que não gosta é a presidente Cristina Kirchner. Pressiona o grupo Clarín, que lhe faz oposição; ameaça estatizar a fábrica de papel de imprensa, numa ameaça de sufocamento dos adversários. Mau sinal: mostra que a situação política, ou econômica, ou político-econômica, vai mal. É nessas horas que os governos costumam voltar-se contra os meios de comunicação, apontados como causadores das más notícias que apenas divulgam.



Ora, bolas!

Não é fácil encontrar um colunista como ele: nos seus tempos de jornal, passeou entre os concorrentesDiário da Noite eÚltima Hora, e sempre carregou junto os leitores de sua coluna humorística "Ora, Bolas!" Também não é fácil encontrar um publicitário como ele: foi quem criou uma série famosa, na Almap, para a cerveja Antarctica, "nós viemos aqui pra beber ou pra conversar?" No marketing político, foi também um homem de êxito, e seu livroComo vencer eleições usando rádio e TV se transformou em referência no ramo. Sérgio Andrade, o Arapuã, morreu há dias, aos 81 anos.

"Ora, Bolas!" ajudou a celebrizar o presidente da Federação Paulista de Futebol, João Mendonça Falcão – aquele que anunciou o jogo do Brasil contra os belgicanos. As piadas de Arapuã sobre Falcão foram usadas, mais tarde, trocando-se apenas o personagem: saiu Falcão, entrou Vicente "quem está na chuva é pra se queimar" Matheus. Falcão podia não ser lá muito alfabetizado, mas era espertíssimo: tanto assim que, em vez de sentir-se ridicularizado pelas piadas de Arapuã, sentiu-se honrado, e encarnou o personagem. Jamais brigou com o colunista. Arapuã escreveu nos jornais enquanto a ditadura ainda não se consolidara; depois, quando seu humor de esquerda passou a ser perseguido, mudou de ramo. Para ele não houve problema: foi um vitorioso por onde passou. Mas nós, leitores, perdemos muito.



Modernidade

O Kindle, aparelho eletrônico de leitura, passa a ser vendido no Brasil pela Amazon – eO Globo lança simultaneamente sua edição digital própria para o Kindle (como diz o anúncio,O Globo pretende estar muito além do papel). Nos Estados Unidos, já há 200 mil e-books próprios para o Kindle, acessíveis por uma rede sem fio. Em português, por enquanto, há quase nada. O Kindle vale pelo jornal, por outros jornais que o adotarem e pela aposta no futuro; e é utilíssimo, neste momento, para quem lê inglês com facilidade. O Kindle está sendo posto à venda em cem países.



Modismo

Já são 179 os parlamentares federais que aderiram ao Twitter – um aumento de 142% em quatro meses. Agora é possível saber que Sua Excelência Fulano de Tal está chegando ao Congresso, ou preparando um discurso, ou almoçando, ou ouvindo o senador Eduardo Suplicy cantar algumstandard de Bob Dylan. É pelo Twitter que sabemos que o governador José Serra diz que gosta dos Beatles.

O número de parlamentares que usam o Twitter cresce explosivamente. E, como diria o poeta, "Para que? Para nada".



Como...

Da edição online de um jornal importante:

** "Sapatos de Imelda Marcos escapa de enchente nas Filipinas"

Assim mesmo: sujeito no plural, predicado no singular. E como é que os sapatos fizeram para escapar sem que ninguém os calçasse?



...é...

Da mesma edição, sobre o mesmo assunto, segue-se o texto:

** "Uma parte da famosa coleção de sapatos da ex-primeira dama das Filipinas Imelda Marcos conseguiu resistir às recentes enchentes que atingiram o país (...)"

Afinal de contas, os sapatos escaparam ou resistiram?



...mesmo?

De um grande portal noticioso:

** "Rio Tietê vai ter redes contra piranhas no interior"

Na foto, duas moças tomando banho num rio.



E eu com isso?

Papel aceita tudo, como garante uma velha definição de jornalismo. E a tela, então? Sem necessidade de gastar papel, que é caro, pode-se escrever à vontade:

** "Kate Hudson palita os dentes em jogo do New York Yankees"

** "Luana Piovani boceja em aeroporto"

** "Britney Spears compra um periquito"

** "Humberto Martins toma um lanche no aeroporto do Rio de Janeiro"

** "Sem dinheiro para comprar zebra, zoo pinta burro"

** "Caminhão atropela casa no RS"

** "Cantor Daniel namora e depois voa de asa delta"

** "Penélope Cruz circula com suposto anel de noivado"

Que será um "suposto anel de noivado"?



O grande título

Este não pode faltar: o título que não coube e entrou assim mesmo. E até ganhou um certo duplo sentido.

** "Frasco `escandaloso´ pisca e emite som para lembrar de tomar"

Há questões armamentistas e, ao mesmo tempo, políticas, mas sempre com um toque meio esquisito:

** "Dassault é privada e definirá se vai transferir tecnologia, diz Jobim"

Que maneira de se referir a uma possível parceira!

O melhor título da semana é doméstico:

** "Márcio Garcia fica todo orgulhoso com exibição de seu curta"

Este colunista é do tempo em que o contrário é que seria verdade.











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NO LLORES POR MI, ARGENTINA...

Kirchners & Chávez: diferenças e semelhanças na relação com a mídia

Por Alberto Dines em 12/10/2009


Convém distinguir generalizações são perigosas: o comportamento do casal Kirchner no tocante à mídia e à liberdade de expressão difere totalmente das opções adotadas pelo venezuelano Hugo Chávez.

A política de intimidação pode assemelhar-se; o modo de acionar os respectivos rolos compressores é diferenciado. Cristina e Nestor Kirchner são políticos experimentados, conservam inequívocos traços populistas e caudilhescos do inspirador do seu partido, Juan Perón, porém mantêm um respeito, ainda que difuso, pelos procedimentos democráticos. Chávez já foi de direita, agora é de esquerda, porém antes de tudo é um militar com ostensivos pendores para a truculência e nenhuma vocação para a negociação política ou para os rituais dos regimes representativos.

Convém acrescentar que no grupo de assessores mais próximos dos Kirchners estão alguns veteranos e brilhantes jornalistas portenhos, com um passado claramente progressista e que jamais poderiam ser acusados de sucumbir às tentações totalitárias.

A nova Lei do Audiovisual foi aprovada na madrugada de sábado com folgada margem pelo Senado argentino. O diário espanhol El País (um dos melhores do mundo, com larga circulação na Argentina) denunciou a estratégia de subornos empregada pelo governo para quebrar a oposição (sábado, 10/10, p.10). Provavelmente está certo, mas a tramitação da lei obedeceu às normas democráticas: foi aprovada pela Câmara e, no Senado, os debates estenderam-se ao longo de 16 horas. Em nenhuma das casas legislativas se produziram alterações nos 166 artigos da proposta original. Nenhum foi vetado – mesmo os mais draconianos e arbitrários.

Autoridade fiscalizadora

É preciso levar em conta que o atual Congresso será substituído em dezembro (como resultado das eleições de junho) por outro claramente anti-Kirchner, o que certamente produzirá regulamentações mais brandas e atenuadoras. Isto sem falar na anunciada batalha judicial através da qual os grupos de comunicação prejudicados – sobretudo o poderoso Clarín e o Uno – tentarão reverter itens mais abusivos.

O mais autocrático, o Artigo 161, dificilmente será mantido ou simplesmente será ignorado, porque foi contestado até por próceres peronistas. O prazo de um ano para que as empresas se adaptem à desconcentração pode ser catastrófico e provocar demissões em massa de jornalistas e técnicos.

Um dado que não pode ser desprezado é que o novo estatuto, pelo menos na aparência, não trata de conteúdo nem visa a controlar a liberdade de expressão. O objetivo é nitidamente desconcentrador. Se os meios de comunicação se assumem fundamentalmente como uma indústria, esta indústria deve ser regulada.

Uma Autoridade fiscalizará a execução da nova lei (tal como na União Européia e nos EUA com a FCC, Federal Communications Comission). Na versão argentina, a composição desta Autoridade favorece claramente o governo: dos seus sete membros, dois são indicados pelo Executivo, dois pelo Conselho Federal de Comunicação (cujos membros são escolhidos pelo governo) e os outros três são apontados pelo Legislativo.

Tratar com a devida eqüidistância

A divisão tripartite dos meios de comunicação (um terço para a iniciativa privada, outro para o governo e o terceiro para a sociedade civil) também é teoricamente desconcentradora, mas na prática pode resultar numa arrumação "chapa-branca", já que os sindicatos podem ser facilmente cooptados pelo oficialismo, antiga tradição peronista. A inclusão de entidades religiosas no terço da sociedade civil deve ser vista como concessão à poderosa igreja católica, extremamente preocupada com a avassaladora invasão das seitas evangélicas brasileiras em canais por assinatura.

As redações dos grandes jornais brasileiros finalmente voltaram a funcionar em horário normal no sábado (10/10) e assim as edições de domingo conseguiram oferecer aquele mínimo de atualidade que se espera dos diários. Embora nossa mídia não esconda sua ojeriza a qualquer medida reguladora, as manchetes podem ser classificadas entre "bem comportadas" a "ligeiramente sobressaltadas".

Globo e Folha ofereceram manchetes objetivas, praticamente iguais ("Senado argentino aprova Lei de Audiovisual" e "Congresso aprova lei de mídia de Cristina"). A do Estadão contrasta com a serenidade do texto ("Kirchners vencem no Senado e aumentam o poder sobre a mídia") [leia aqui e aqui].

Esta é uma "pauta" que a mídia brasileira não pode abandonar e tem a obrigação de tratar com a devida equidistância. A Argentina é logo ali e qualquer tentativa de manipulação provocaria justificadas reações e comprometeria o alto nível do time de correspondentes sediados em Buenos Aires.

terça-feira, 4 de agosto de 2009



Verbo Solto
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Uma pergunta para a imprensa: e daí?
Postado por Luiz Weis em 3/8/2009 às 9:09:08 PM



Se a imprensa fosse uma forma de medicina, a sua especialidade seriam crises agudas e não doenças crônicas.

Notícia, em sentido estrito, é o acontecimento que irrompe, não a situação conhecida que prossegue – embora raramente sejam claras as fronteiras entre o novo e o velho.

Quando apresenta as conexões de uma coisa com a outra, o jornalismo vai além de sua função primária de dar as últimas. Nessas ocasiões, se distingue como fonte de transmissão de conhecimentos e não apenas de informações pontuais, singulares.

A sua dificuldade hoje em dia é conciliar a função de pôr os fatos em perspectiva, em histórias mais elaboradas e mais extensas, com um público cuja capacidade de concentração pode ser medida, no limite, pela consagração da brevidade do Twitter, em seus já célebres 140 caracteres por mensagem.

Muita gente critica a imprensa pela sua superficialidade, mas na hora do vamos ler a maioria prefere mesmo dar uma passada de olhos nas páginas impressas, detendo-se aqui e ali para dar uma bicada no noticiário. Disso a internet dá conta perfeitamente bem.

Se os jornais entregarem os pontos, tornando-se ainda mais superficiais, aí sim se cumprirá – por si própria – a profecia da sua irrelevância, quando não do seu desaparecimento.

O oposto da superficialidade, em todo caso, não é a pretensão de explicar o mundo a cada edição, nem transformar matérias em monografias, mas dar um passo adiante na busca do “e daí?” dos fatos ostensivos.

O que se quer dizer com isso está na Folha da segunda-feira, 3. Na primeira página do caderno “Dinheiro”, o jornal publica uma arrumada reportagem sobre o crescimento do mercado de automóveis, mais intenso em outras regiões do país do que no que no Estado de São Paulo.

Pensando bem, era de esperar. São Paulo só perde para o Distrito Federal em matéria de habitantes por carro (5,1). Em Pernambuco, por exemplo, a relação é de 17,9. Na Bahia, 23,9. À medida que a renda nacional começa a se desconcentrar, é lógico que as vendas de autos cresçam proporcionalmente mais nos Estados onde é menor a parcela motorizada da população.

O jornal poderia ter se limitado a contar essa história, com o caso “humano” de praxe e os números que a resumem – nos últimos anos, enquanto o comércio de carros cresceu em São Paulo 2,3 vezes a menos do que a média nacional, no Ceará, por exemplo, o crescimento foi 1,7 a mais.

Mas alguém teve o estalo de acrescentar ao relato dessa tendência uma sacada sobre os seus efeitos. Daí resultou a matéria “Trânsito caótico pode chegar a outras cidades”, sobre a propagação da principal doença crônica das metrópoles brasileiras (para voltar à metáfora que abre esta nota).

A matéria flui porque se baseia em declarações de um dos maiores especialistas no setor, o ex-secretário de Transportes Metropolitanos do Estado de São Paulo, Cláudio de Senna Frederico.

“É só uma questão de tempo e de renda”, diz ele, sobre a disseminação dos engarrafamentos paulistanos, que há pouco alcançaram o recorde de 293 quilômetros de lentidão, num começo de noite.

O ponto forte da previsão é que, até onde a vista alcança, as pessoas continuarão preferindo o transporte individual apesar do imenso tempo desperdiçado nos engarrafamentos. O entrevistado vai além. Quanto menos carros existem numa localidade, raciocina, maior será o ganho de posição social dos que conseguirem comprar o seu. Aí a procura de conforto é reforçada pela busca de status, diferenciação.

“Do ponto de vista urbanístico”, reflete Frederico, “é um terror, mas esse estilo de vida é considerado uma conquista”.

Reparem que não se está falando de nenhuma proeza jornalística, mas de uma pequena diferença que um jornal pode fazer na abordagem de um grande assunto. Chama-se a atenção para o que de outro modo seria uma obviedade porque a imprensa brasileira deixa passar entre os dedos, com uma frequência injustificada, oportunidades corriqueiras de alargar a sua pauta informativa. É esse o jogo que terá de jogar cada vez mais – para não ser derrotada no próprio campo.

CENSURA TOGADA


O silêncio de Gilmar

Por Alberto Dines em 4/8/2009

O paladino da liberdade de expressão, o ministro Gilmar Mendes, preferiu não se manifestar na segunda-feira (3/8) a respeito da decisão do desembargador Dácio Vieira de proibir o Estado de S.Paulo de continuar a veiculação de informações sobre a Operação Boi Barrica que enredou o filho do senador José Sarney e gerenciador dos seus negócios.
O ministro tinha um bom pretexto: na condição de presidente do Conselho Nacional de Justiça, deveria comandar a solenidade de recepção dos novos conselheiros. Contrariando os seus hábitos, foi extremamente comedido: saudou protocolarmente os novos conselheiros, anunciou em termos sucintos as metas do CNJ e louvou o planejamento estratégico "como instrumento indispensável à administração da justiça".
O processo político em frangalhos, o Legislativo achincalhado pelo fisiologismo, o Estado de Direito ameaçado por magistrados ineptos e o presidente da suprema corte adota a postura de um CEO preocupado com a administração dos seus negócios, esquecido dos valores que estão sendo destroçados.
Irrelevâncias, modismos
A censura togada mostra, mais uma vez, que veio para ficar. Um quarto de século depois da redemocratização voltamos ao vale-tudo. Desta vez expresso em juridiquês. Os senadores Fernando Collor e Renan Calheiros, igualmente acusados de improbidade, são proprietários de currais midiáticos em Alagoas, o estado que dividiram entre si. E, no entanto, não pouparam ataques à mídia na vergonhosa sessão de reabertura dos trabalhos legislativos. Como se a imprensa fosse culpada pelos vexames produzidos na Cidadela da Devassidão, também chamada de Senado.
O senador José Sarney declara que em sua longa carreira política jamais processou um jornalista e, em seguida, lê uma nota em que designa o trabalho jornalístico do Estadão como "infamante campanha". Tenta demarcar-se da ação patrocinada pelo filho, o empresário de mídia Fernando Sarney, e, ao mesmo tempo, endossa o ato censório promulgado por um magistrado ligado ao seu clã.
A República vive um de seus piores momentos – a única instituição capaz de salvá-la é a imprensa. Só ela é capaz de despertar a sociedade diante das emergências. Ao mesmo tempo em que distrai o cidadão com a enxurrada de irrelevâncias e modismos, também é capaz de embargar esta avalanche de hipocrisia e cinismo.
Coluna semanal
A censura ao Estado de S.Paulo foi anunciada na sexta-feira (31/7), véspera do vácuo do fim de semana. O jornal agredido protestou com veemência na segunda (3/8), em editorial (ver "
Afronta à democracia"). O Globo e Folha de S.Paulo preferiram esperar, não querem valorizar o competidor.
O triunvirato de jornalões sabe irmanar-se em questões monetárias ou quando investe contra os moinhos de vento da regulamentação. Foi uníssono na liquidação da exigência do diploma e da especificidade do ofício jornalístico, mas não consegue marchar unido em defesa da democracia. Ao recusar a imediata solidariedade a um concorrente revela o seu lado menos nobre, mais corporativo e oportunista.
Neste mesmo triunvirato o papel pior está sendo desempenhado pela Folha. É doloroso perceber que o jornal que em apenas 34 anos tornou-se o mais influente do país sem recorrer a espalhafatosas reformas, apoiado apenas em suas páginas de opinião, em seis meses entregou os pontos. A manutenção da coluna semanal de José Sarney confronta o seu garbo e a sua intransigência em favor do jornalismo independente, livre de compromissos políticos, de rabo preso no leitor.
Haraquiri coletivo
Na sexta-feira (31/7), a Folha foi novamente pisoteada por Sarney ao publicar – pela primeira vez nesta crise – um artigo claramente parcial, demagógico, impertinente, hostil à imprensa e ao clamor da sociedade. O libertário Sarney investiu contra a empresa que edita a Folha de S.Paulo, contra o jornal onde se abriga, contra seus colegas de página e contra os leitores que abominam a sua hipocrisia. Trechos:
** "Hoje com a sociedade de comunicação, os princípios da guerra aplicados à política são mais devastadores do que a guilhotina da praça da Concorde. O adversário deve ser morto pela tortura moral..."
** "Como julgar uma democracia em que não se tem uma lei de responsabilidade da mídia, nem direito de resposta, diante deste tsunami avassalador da internet e enquanto a Justiça anda a passos de cágado? Como ficam os direitos individuais, a proteção à privacidade, o respeito à pessoa humana?"
Impossível ignorar a óbvia existência de um pacto entre o jornal e o seu colunista: ele manteria a sua coluna desde que não a usasse para defender os seus interesses pessoais ou políticos. O pacto funcionou desde o início de fevereiro até a sexta-feira, 31/7.
O político amapo-maranhense, mais uma vez, passou a perna no parceiro, não cumpriu a palavra: usou o jornal para satanizar a imprensa e para vitimizar-se. A esta altura, Sarney faz com a Folha o que bem entende. Acreditou na campanha de assinaturas do jornal pela TV e acha que todos são moscas.
Neste haraquiri coletivo, às vésperas dos 70 anos do início da Segunda Guerra Mundial, conviria parafrasear Winston Churchill: "Nunca tantos se imolaram tanto por tão pouco".

Caso Sarney

A guerra suja no Senado

Por Luciano Martins Costa em 4/8/2009

Comentário para o programa radiofônico do OI, 4/7/2009

O noticiário político de terça-feira (4/8) não surpreende quem ouviu rádio, assistiu aos telejornais ou acessou os noticiários online na segunda-feira à noite. Mas haveremos de convir que a reprodução do bate-boca que se desenrolou no Senado Federal traz um sabor especial ao leitor. Afinal, aquilo que se esperava pudesse ser o funeral da carreira política de José Sarney acabou se revelando a ressurreição de Fernando Collor e a reedição de histórias de mais de duas décadas atrás, quando Tancredo Neves se lançou candidato à presidência da República.
Por cima de tudo, fica a sensação de que a atual crise no Senado é apenas a nova versão de uma velha guerra suja. E que em política nada se cria e nada se renova.
Quando o senador Pedro Simon, que sobrevive no PMDB do Rio Grande do Sul, subiu à tribuna, muitos repórteres viram confirmada a pauta de suas redações, que esperavam o discurso que poderia representar o começo do fim para José Sarney.
Depois de um recesso no qual mal conseguiu respirar, tantas as acusações que lhe foram feitas através da imprensa, esperava-se que o presidente do Senado não tivesse mais forças para resistir e que, finalmente, aceitasse as recomendações para deixar o cargo e salvar o mandato. Mas a tropa de choque entrou em campo e o que se viu foi a guerra aberta.
Fonte de manchetes
O episódio surpreende porque, há dias, editoriais e comentários da imprensa vêm afirmando que José Sarney volta do recesso mais fragilizado do que há um mês. Na véspera, todos os grandes jornais afirmavam que Sarney havia sido convencido a renunciar à presidência do Senado.
Pode ser que a imprensa tenha levado em conta apenas o que publica, e não o que se esconde nos bastidores. Tampouco parece ter dado crédito à opinião dos advogados contratados por Sarney, que consideram relativamente fácil contestar todas as onze acusações encaminhadas ao Conselho de Ética.
Pelo que foi insinuado na tribuna, o punhado de dossiês com que a tropa de choque do presidente do Senado ameaça seus adversários é outra fonte de boas manchetes. Se os jornais estiverem interessados, é claro.
As voltas da História
O retorno de Fernando Collor ao primeiro plano da cena política é outro fato digno de registro. Ele mesmo fez questão de relembrar que foi personagem central de um grande escândalo e da mais longa e penosa escaramuça pelo poder da República desde o processo de redemocratização. Caiu, amargou o ostracismo por oito anos, mas não foi condenado pelo Supremo Tribunal Federal.
As acusações que mobilizaram os jovens na época e produziram as manifestações pelo impeachment não resistiram à prova da corte, e agora Collor retorna para defender o antigo desafeto, produzindo uma situação inusitada. Afinal, ele foi inventado pela imprensa para evitar que o sindicalista Lula da Silva chegasse ao poder em 1989.
É fato notório que a candidatura de Fernando Collor à presidência da República, na ocasião, foi alimentada por uma série de reportagens na TV Globo, que o apresentavam como o "caçador de marajás" e o paladino contra a corrupção. Depois, ele foi sacramentado por uma "consulta" armada pelo jornal O Estado de S.Paulo no Viaduto do Chá, no centro da capital paulista, da qual o então governador de Alagoas emergiu ungido em "popularidade".
Agora que volta ao centro do palco, anunciando sua disposição de revirar os baús para atacar os inimigos de Sarney, Collor pode se tornar uma pedra incômoda nos sapatos de algumas figuras da imprensa que o ajudaram a se eleger há vinte anos. Não será surpresa se aproveitar a atual crise política para se colocar em condições de disputar novamente a presidência da República.
Quem viver, verá.
***
Em busca dos jovens
O Observatório da Imprensa na TV vai mostrar como os jornais e revistas brasileiros estão tentando falar com o público jovem. São cada vez mais comuns os cadernos e títulos de papel voltados para a faixa etária dos 13 aos 20 anos, mas esse público demonstra maior preferência pelos meios digitais de comunicação.
O Observatório da Imprensa vai ao ar nesta terça-feira (4/8) às 22h40, ao vivo, pela TV Brasil. Pela Net, canais 4 (SP), 16 (DF), 18 (RJ e MA); pela Sky-Direct TV, canal 116; pela TVA digital, canal 181.

sexta-feira, 6 de março de 2009

Produtores da região de Ouro Preto recebem sementes selecionadas de feijão

Porto Velho (Decom) - Dando continuidade à entrega de sementes selecionadas de feijão, o vice-governador João Cahulla (foto), esteve nesta sexta-feira (6) nos municípios de Teixeiropólis, Urupá, Mirante da Serra e Nova União, distribuindo os grãos para que os pequenos produtores rurais possam efetuar o plantio, na época certa, assegurando uma maior safra e maior qualidade da produção, que tem aumentado a cada ano, graças ao apoio do Governo, que tem incentivado a expansão da produção de grãos.
“Desde o ano de 2003 que a administração Ivo Cassol implantou o programa Semear, distribuindo sementes selecionadas de arroz, milho e feijão, gratuitamente, para que a agricultura familiar possa se fortalecer, assegurando a subsistência das famílias. Foi um projeto que iniciamos em Rolim de Moura, junto com o Promec, e muitos não acreditaram que pudesse ser o sucesso que se tornou hoje, em todas as regiões”, explicou Cahulla, na comunidade Vitória, na Linha 31, em Teixeiropólis, onde fez a entrega de 4.000 quilos de sementes de feijão.
O secretário de Agricultura, Carlos Magno, os deputados estaduais Edson Martins e Luizinho Goebel, os secretários regionais Ari Saraiva (Ji-Paraná) e Ednaldo Andrade (Ouro Preto), o secretário regional da Emater, Polaco, prefeitos e vereadores, entre outras autoridades, prestigiaram as solenidades de entrega.
“Além do programa Semear, o Governo tem o Promec, com cinco horas máquinas para cada produtor rural, estamos fortalecendo o Pró-Peixe, que vai incrementar a piscicultura e garantir mais renda aos produtores, estamos lutando pela reativação da usina de calcário, melhorando as nossas áreas, as nossas pastagens, produzindo mais, no mesmo espaço de terra, o Pró-Leite, que melhora a nossa produção leiteira, o Inseminar que melhora o nosso rebanho, enfim, são várias ações no setor rural e em 2009 teremos ainda mais investimentos”, anunciou Carlos Magno.
Sementes e transporte escolar para Urupá - O município de Urupá, além dos 12.000 quilos de sementes selecionadas de feijão para os produtores, João Cahulla também assinou o convênio de transporte escolar, no valor de R$ 630 mil, assegurando a condução dos alunos até à sala de aula. Cahulla também entregou uma máquina beneficiadora de arroz para a Associação Agrifam, atendendo emenda do deputado estadual Luizinho Goebel. A solenidade ocorreu no barracão da Linha C4.
“Esse convênio assegura o transporte dos alunos, garantindo a frequência e impedindo a evasão escolar. Sem o apoio do Governo, a prefeitura teria muitas dificuldades em custear o transporte, por isso é tão importante esse convênio”, destacou o prefeito de Urupá, Célio de Jesus.
Na linha 64, na Associação de Produtores rurais, em Mirante da Serra, Cahulla entregou 11.000 mil quilos de sementes de feijão, que começam a ser plantados já na próxima semana. “É a hora do plantio, na segunda eu começa a plantar e espero colher uma boa produção, para meu consumo e espero vender uma parte”, disse a agricultora Edna da Silva, de Teixeiropólis, que mora em uma pequena área de pouco mais de dois hectares. “Não teria como comprar a semente. Por isso, quero devolver os mesmos 20 quilos que estou recebendo, para que outras pessoas carentes possam ser beneficiadas”, completou a produtora rural.
O vice-governador encerrou a sua agenda em Nova União, na escola Pólo da linha 81, onde distribuiu 5.000 mil quilos de sementes selecionadas de feijão. E neste sábado, Cahulla entrega mais 12.000 mil quilos em São Felipe e 2.000 em Primavera de Rondônia, onde também entrega 20 casas populares, do projeto Moradia Digna.

Noticias de Rolim de Moura

Prefeitura homenageia funcionárias públicas

Rolim de Moura (Assessoria) - Representando a Administração Municipal de Rolim de Moura, o Prefeito Tião Serraia, prestou na manhã desta sexta-feira, 06.03, uma homenagem às servidoras públicas do município, em comemoração ao Dia Internacional da Mulher, celebrado neste domingo (08). Numa confraternização realizada no auditório da Semagri – Secretaria Municipal de Agricultura, ele destacou as conquistas e a importância da mulher na sociedade atual e os desafios que ela tem a enfrentar.
“Atualmente, a mulher vem ocupando um espaço significativo perante a sociedade, representando um marco nas conquistas de quem batalha com afinco para buscar reconhecimento. Hoje, é notório o espaço que elas vem apoderando, merecendo toda a nossa admiração e respeito. Nada mais justo do que prestar essa pequena homenagem àquela que além de trabalhar na sociedade, seja como funcionária pública ou particular, é mãe, esposa e dona do lar, mostrando diariamente uma lição de vida e moral.” Finalizou.
A homenagem contou ainda, com a leitura de um poema entoado pela mestre de cerimônia, Fabiana Cortez, e uma mensagem bíblica, apresentada pela missionária da Igreja Metodista Wesleiana, Ana Cristina. A vereadora Nice Chagas (PP), também fez uma retribuição de honra e congratulações às funcionárias. Na ocasião, a Primeira Dama do Município, Ana Maria Ferraz, foi presenteada com flores, representando todas as mulheres rolimourenses.
A comemoração foi encerrada com um café da manhã especial e a distribuição de lembranças. O evento contou com a organização da Coordenadora do Conselho Municipal de Trânsito, Juliane Moura e da Gerente de Relacionamento Cidadão e Prefeitura, Rosângela Lucia Machado.

Escuta Zé




Assédio moral na TV

Primeiro, espinafraram o Clodovil. Como nunca simpatizei com o dublê de costureiro e apresentador, fiquei quieto.



Depois, eles implicaram com o Paulo Betti. Como o ator, por sua vez, foi um pouco grosseiro, continuei calado.
Mais tarde, investiram contra Carolina Dieckmann e a Luana Piovani. Sempre achei as duas meio antipáticas; assim, ainda que um pouco incomodado, permaneci mudo.
Agora, eles mexeram com a Cláudia Alencar. Desta vez não consigo deixar para lá. Mexeu com a Cláudia Alencar, mexeu comigo.
Está ficando revoltante o modo como os comediantes do programa Pânico na TV, da Rede TV, abordam as pessoas em suas "entrevistas".
Não sei como ninguém ainda não entrou na Justiça processando seus responsáveis por assédio moral.
No começo, seus comediantes ainda eram um pouco engraçados; eles só apelavam para a baixaria quando o assediado (não se pode usar o verbete "entrevistado" nesse caso) se mostrava do mesmo nível do "Repórter Vesgo" e do "Silvio Santos", ou seja, baixíssimo.
Com o tempo, porém, provavelmente pelo esgotamento do repertório de piadas e pela falta de imaginação para novas pautas mais criativas, partiram para o ataque direto, grosseiro e covarde.
Suas investidas podem ser comparadas às de neonazistas que escolhem suas vítimas ao acaso, nas ruas, espancando-as até que percam os sentidos, ou a vida.
A diferença é que "Vesgo", "Silvio Santos" e os produtores do Pânico ferem quase de morte, em alguns casos, a imagem dos artistas que assediam.
E imagem é tudo para o artista. No final das contas, é seu ganha-pão.
Mas para garantir o seu (lá deles) próprio sustento, a turma do programa da Rede TV não poupa esforços, indelicadeza, grosseria e efeitos técnicos para tentar ridicularizar a vítima da vez, ainda que esta, inocente e desavisada, atenda-os cordialmente.
Às vezes não poupam nem a violência física. Outro dia, chegaram a derrubar no chão a atriz Lady Francisco, uma senhora já idosa, e a passar meleca no cabelo do ator Wagner Moura.
Domingo passado, entre outros desafortunados, a atriz Cláudia Alencar cruzou o caminho dos dois.
Cercaram-na ameaçadoramente, fizeram uma pergunta sem sentido e, diante do espanto da atriz, ainda usaram, na edição da "matéria", um efeito técnico para tentar ridicularizá-la.
Foi mais uma covardia de quem tem a câmera, o microfone, o estúdio, enfim, uma estrutura poderosa para simplesmente tentar tirar graça da desgraça alheia.
Não conheço a atriz Cláudia Alencar pessoalmente, mas todas as vezes em que a vi em entrevistas achei-a gentil, delicada, muito simpática. E um pouco frágil, também. Dizem até que é poetisa.
Lembro-me de duas personagens da atriz: a divertida Patativa, de Roda de Fogo, e a prefeita de Porto dos Milagres.
Esta última criou uma fantasia em mim, difícil de esquecer até hoje: ela acordava o marido todas as manhãs, fazendo uma deliciosa massagem em seus pés.
Como dizia um amigo meu, para uma mulher assim eu entregaria meu holerite todo fim de mês.

Primeiro eles vieram...

Quem ainda não conhece clique aqui e leia o poema parafraseado na abertura da crônica acima, que começa com a frase "Primeiro eles vieram atrás dos comunistas...".
Ele é de autoria do pastor evangélico alemão Martin Niemoller (1892-1984), preso por Hitler, em 1938, durante a ascensão nazista.

É para ler e guardar.


Escrito por José Luiz Teixeira de “www.escutaze.com.br”

Jornal de Debates

“DITABRANDA” EM DEBATE

A briga em que todos perdem

* Eugênio Bucci

Hay que "enfurecerse", pero sin perder la "brandura" jamás.

Lá se vão duas semanas do fatídico editorial da Folha de S.Paulo que, após alertar para o risco de tirania que se avoluma na Venezuela, referiu-se de passagem à ditadura militar no Brasil como um regime cujo grau de truculência teria sido relativamente tênue. Por terem preservado ou instituído "formas controladas de disputa política e acesso à Justiça", os governos militares entre 1964 e 1985 teriam pertencido à categoria – até então desconhecida de todos nós – das ditaduras amenas, ou, nos termos do editorial, das "chamadas ditabrandas".
Foi um terremoto no agreste. O neologismo trocadilhesco, meio de pé quebrado, provocou uma erupção vulcânica de cartas à redação. Cartas furibundas. Várias foram publicadas nos dias subseqüentes no "Painel do Leitor" da própria Folha. Entre essas, chamaram bastante atenção, pela contundência, as mensagens dos professores da USP Maria Victória Benevides e Fábio Konder Comparato.

Escreveu Maria Victória:

Mas o que é isso? Que infâmia é essa de chamar os anos terríveis da repressão de "ditabranda"? Quando se trata de violação de direitos humanos, a medida é uma só: a dignidade de cada um e de todos, sem comparar "importâncias" e estatísticas. Pelo mesmo critério do editorial da Folha, poderíamos dizer que a escravidão no Brasil foi "doce" se comparada com a de outros países, porque aqui a casa-grande estabelecia laços íntimos com a senzala – que horror!

Fábio Comparato foi mais duro:

O leitor Sérgio Pinheiro Lopes tem carradas de razão. O autor do vergonhoso editorial de 17 de fevereiro, bem como o diretor que o aprovou, deveriam ser condenados a ficar de joelhos em praça pública e pedir perdão ao povo brasileiro, cuja dignidade foi descaradamente enxovalhada. Podemos brincar com tudo, menos com o respeito devido à pessoa humana.
A ambos, a Folha dedicou uma resposta especial, personalizada, capaz de aturdir boa parte do leitorado:
Nota da Redação – A Folha respeita a opinião de leitores que discordam da qualificação aplicada em editorial ao regime militar brasileiro e publica algumas dessas manifestações acima. Quanto aos professores Comparato e Benevides, figuras públicas que até hoje não expressaram repúdio a ditaduras de esquerda, como aquela ainda vigente em Cuba, sua "indignação" é obviamente cínica e mentirosa.

O sentido de recapitular

Tenho consciência de que, ao recapitular essas passagens aqui no Observatório, sabidamente freqüentado por leitores muito bem informados sobre as turbulências da imprensa, incorro no velho erro de chover no molhado: transcrevo o que todos já sabem. A recapitulação, contudo, cumpre uma função lógica da qual não tenho como me desviar. Essa função lógica se desdobra em dois planos, como exponho a seguir.
O primeiro desses dois planos é, por assim dizer, de ordem formal: refere-se à periodicidade da minha coluna. Em outras palavras, esse plano de ordem formal é quem justifica que eu trate, só agora, e não antes, de um assunto relativamente envelhecido. Sabemos todos que o discurso jornalístico, mesmo quando crítico ou ensaístico, deve se ocupar de novidades. Por que, então, ocupar-me do já sabido? A resposta é simples: porque, para a periodicidade da minha colaboração para este site, que se dá de duas em duas semanas, este assunto ainda é perfeitamente atual. O evento ao qual me refiro, por mais que tenha sido debatido em blogs, sites e publicações de todo tipo, inscreve-se rigorosamente no período que separa a minha coluna anterior, do dia 17 de fevereiro, desta aqui, de hoje, dia 3 de março de 2009. Por isso esperei para falar só hoje. Só aqui, neste Observatório, eu poderia desenvolver os pontos essenciais do que tenho a dizer.
Passemos agora ao segundo plano da função lógica que essa recapitulação vem cumprir. Aí não há nada de razões formais, mas de mérito. É preciso recuperar a sucessão desses três lances – o editorial, depois as cartas e, por fim, a resposta em forma de "Nota da Redação" – para demonstrar o que me leva a escrever. Agora, não falo apenas da forma (a periodicidade) que me permite escrever "só agora", mas do mérito que me impele a escrever.
Quanto a esse mérito, é por demais penoso, para mim, ver essas duas palavras, a palavra "cínica" e a palavra "mentirosa", fixarem-se de modo tão ríspido sobre uma atitude pública de Fábio Comparato e Maria Victória Benevides. Mais penoso ainda seria silenciar diante disso. Por que tanta violência contra eles? O próprio ombudsman da Folha, Carlos Eduardo Lins da Silva, em sua coluna de 22 de fevereiro, ainda que cercado de toda cautela, advertiu:
"Um editorial com referência ao regime militar brasileiro provocou cartas publicadas no Painel do Leitor. Resposta da Redação a duas delas na sexta foge do padrão de cordialidade que julgo essencial o jornal manter com seus leitores."
O termo preciso talvez não fosse "cordialidade", mas urbanidade ou, quem sabe, civilidade. Se não se empenhasse em resguardar as condições para o diálogo, mesmo onde elas pareçam quase impossíveis, é pouco provável que um órgão de imprensa representasse o seu público e influenciasse a sociedade. A lógica defendida por Carlos Eduardo Lins da Silva, portanto, é inatacável porque elementar.
Isto posto, o que chocou na manifestação da Redação foi o ataque deliberadamente pessoal aos dois leitores. O golpe desferido contra eles teve o sentido de expeli-los nominalmente. Haverá, por certo, em defesa da "Nota da Redação", o argumento de que ela apenas reagiu aos termos da carta do professor Fábio Comparato, que já eram pesados, de fato. Qualquer leitor poderá verificar facilmente que o jurista elegeu, em sua crítica ao jornal, alvos personalizados. Ao dizer que "o autor do vergonhoso editorial de 17 de fevereiro, bem como o diretor que o aprovou, deveriam ser condenados a ficar de joelhos em praça pública e pedir perdão ao povo brasileiro", ele atingiu pessoas, mais que uma instituição. Sem dúvida, não foi uma fala cordial. O castigo preconizado pelo grande professor de direito parece inspirado em rituais da Santa Inquisição, e, ainda que irônico, é direcionado contra pessoas de carne osso. Portanto, foi Comparato quem primeiro "fulanizou" a discussão.

Quem ganha?

Em uma coluna no dia 24 de fevereiro, na página A2, sob o título de "Ditadura, por favor", o editor de Brasil da própria Folha, Fernando Barros e Silva, assinalou com todas as letras a sua discordância com o editorial do diário em que trabalha. Rechaçou o termo "ditabranda". Ao mesmo tempo, não deixou de criticar o excesso verbal de Fábio Comparato:
"É bem sintomático, aliás, que, ao protestar contra a `ditabranda´ em carta à Folha, o professor Fábio Konder Comparato, guardião do `devido respeito à pessoa humana´, tenha condenado os autores do neologismo a ficar `de joelhos em praça pública´ para `pedir perdão ao povo brasileiro´. Que coisa. Era assim, obrigando suas vítimas a ajoelhar em praça pública, submetendo-as à autêntica `tortura chinesa´, que a polícia política maoísta punia desvios ideológicos durante a Revolução Cultural. Quem sabe, como a `ditabranda´, seja só um palpite infeliz."
Acontece que, mesmo que se admita que a carta tenha ido além do que seria meramente razoável, o argumento de que o jornal reagiu no mesmo diapasão e, portanto, em "legítima defesa", não procede. Pela simples razão de que, se fossem se pautar pelos padrões de etiqueta do leitorado, os órgãos de imprensa converteriam a ofensa aberta no idioma oficial de suas seções de cartas. Aí, qualquer comunicação com o público perderia a viabilidade.
Cabe ao jornal zelar pelas condições do diálogo, e isso por motivos funcionais, mais que morais, mesmo quando zelar pelo diálogo implica sacrifício de orgulho pessoal de um ou de outro. Não há escapatória. Se deixarem de cultivar e de cultuar o diálogo com o seu público, os órgãos de imprensa perderão seu lugar. Também por isso, o ombudsman tem razão.
Digamos assim: ele tem razão e, não obstante, essa razão que ele tem não resolve coisa alguma. Estamos aí, hoje, às voltas com um bate-boca destemperado e ensandecido. A polêmica assumiu proporções de movimentos radicalizados, de parte a parte. Adjetivos periféricos, ou mesmo marginais, ganharam o relevo de conteúdos centrais. De um lado, a associação entre Fábio Comparato e o maoísmo, um volteio estilístico de Fernando Barros e Silva, adquire aos olhos de muitos o estatuto de verdade factual, o que é apenas absurdo. De outro lado, fala-se que a Folha de S.Paulo protegeu e ajudou a ditadura militar, o que, pelo menos a partir do limiar da década de 1980, está longe, muito longe de ser verdade. Caímos numa discussão enlouquecida do acessório, enquanto o principal foi jogado no lixo.
Quem ganha com a radicalização? Apenas os inimigos da democracia – e entre eles não figuram nem Maria Victória Benevides, nem Fábio Comparato, nem a Folha de S.Paulo. Essa briga, do jeito que ficou montada, é um desastre. É um desastre sem lastro de verdade.

Um grande brasileiro

Pelos motivos que já expus, penso que o professor Fábio Comparato exagerou na carta que enviou ao jornal. Como educador enérgico que sempre foi, talvez ele tenha agido como quem quer passar um pito. Errou a mão, ao menos no meu modo de ver, mas isso não o diminui em nada – nem faz dele um stalinista. Considero Fábio Konder Comparato um dos maiores brasileiros vivos. Como jurista, como professor, como exemplo de coerência, tenho em sua figura, há quase trinta anos, um modelo de retidão, de inteligência, de dedicação ao ensino e ao interesse público.
Vi mais de uma geração de políticos, jornalistas, advogados, juízes e outros cidadãos de brilho que passaram pela Faculdade de Direito do Largo São Francisco, em São Paulo, ser formatada pela figura desse homem de valor imenso, um valor difícil de aquilatar quando o olhamos de perto. Recentemente, dei uma aula na Escola de Governo que ele fundou. Não há como ficar indiferente a essa experiência. A maneira incondicional com que Comparato se empenhou e se empenha na missão de formar lideranças para capacitá-las a trafegar pelos meandros da gestão pública está acima, muito acima da média. Eu me lembro de uma carta que ele me enviou há mais de vinte anos, que guardo até hoje, em que falava de seu projeto "quixotesco" de criar uma escola de governo. Pois ele a criou e ela é hoje uma realidade em várias cidades.
Também não é verdade que Fábio Comparato tenha se calado sobre as brutalidades cometidas pelos regimes de esquerda. Não é verdade. Tenho notícias de que ele e Maria Victória, entre outros, já em 1989, assinaram um documento que foi entregue a Fidel Castro condenando os fuzilamentos de militares cubanos por suposto envolvimento com o narcotráfico. Eles também se manifestaram contra a política do regime chinês em relação ao Tibet. Há inúmeros textos de Comparato em que o compromisso com a defesa da vida humana, acima das ideologias, é claro. Mais que isso, ele infundiu essa mentalidade de defesa da vida em mim e em vários outros, melhores do que eu, que hoje atuam nas mais diversas áreas profissionais. Ele jamais nos ensinou a fechar os olhos para as atrocidades dos regimes de esquerda. Para não falar de modo vago, cito dois trechos de um de seus trabalhos recentes, o livro Ética, publicado em 2006 pela Companhia das Letras, que não deixam dúvida sobre o que ele pensa das tiranias ditas de esquerda. As duas passagens estão na página 347:
"Os Estados comunistas descambaram, todos eles, para a institucionalização do abuso de poder, chegando mesmo, alguns deles, ao totalitarismo."
(...)

"A questão central da relação de poder, no seio da sociedade, não é a de se saber como suprimi-la, mas sim a outra, muito mais delicada e complexa, de se instituir um eficiente sistema de controle do poder, em todos os setores – econômico, político, religioso, cultural etc. –, por aqueles que devem a ele submeter-se. Mas essa questão, lamentavelmente, não foi enfrentada por Marx."
A esquerda brasileira, desgraçadamente, tem os seus oportunistas, seus ladrões, tem os cínicos, os mentirosos, gente que protege a bandalheira e nela se lambuza, os tipos mal-intencionados que transformam em atos de heroísmo os crimes comuns e vulgares praticados pelos apaniguados. Tudo isso é fato. Mas Maria Victória Benevides e Fábio Konder Comparato sempre foram e continuam sendo o oposto disso. Não há registros de que tenham se dobrado aos encantos do poder – de direita ou de esquerda. Não há indicadores de vantagens materiais que lhes tenham sido entregues pela adesão a uma causa. São brasileiros que engrandecem este país e esta gente. Você pode discordar deles e de alguns arroubos que podem cometer, como qualquer um de nós. Mas não se pode desqualificá-los sumariamente. Eles não são cínicos nem mentirosos. Eles são maiores, muito maiores.

Esquisitices e irregularidades

Quando digo que essa briga é um desastre, penso nas radicalizações que empalidecem ou mesmo soterram a verdade e conduzem os contendores à escuridão. Voltemos o nosso olhar para o outro lado dessa torcida armada, voltemos o nosso olhar para o lado que agora ataca ferozmente a Folha de S.Paulo. O que vemos? Vemos um turbilhão que quer caracterizar a Folha como um pilar da ditadura – ou, pior, da "ditabranda". Cair nessa armadilha retórica é uma temeridade – e até mesmo os melhores, quando movidos pela raiva repentina, embarcam nessa falácia.
Eu era estudante de direito e de jornalismo quando militava numa organização trotskista, a OSI (Organização Socialista Internacionalista). Devia ser 1980, talvez 1981. Cabia a mim secretariar uma célula da organização na Faculdade de Direito da USP. Uma manhã, indo a pé da Rua Riachuelo para o Largo de São Francisco, passei por uma banca de revistas e vi lá uma edição da Folha da Tarde com uma chamada que me desconcertou. Eles publicavam na íntegra o estatuto da OSI. Aquilo era produto de espionagem policial, coisa de alcagüetagem, não de reportagem. O que senti na época é que ali estava um diário a serviço da repressão, não do leitor, não do cidadão. Isso eu vivi e isso é verdade.
Outra coisa é a Folha de S.Paulo. Ela é, de fato, um dos melhores jornais do país, por qualquer critério que se queira analisá-la. Em 1984, ao abraçar a campanha pelas Diretas Já, a Folha desmistificou essa história de neutralidade jornalística. Não há neutralidade entre a democracia e a ditadura. Nesses casos, a imprensa tem, sim, um partido: o partido da liberdade. Fora da liberdade, a imprensa morre. As reportagens de Ricardo Kotscho marcaram época – e com justiça. Depois, em 1992, poucos enfrentaram a corrupção do governo Collor com tanta coragem quanto a Folha de S.Paulo, que chegou a receber invasões de policiais em sua sede, com atitudes de intimidação inimagináveis, além de sofrer processos ameaçadores, conduzidos por má fé e por outras baixezas.
A Folha modernizou o jornalismo no Brasil como poucos outros jornais. Alguns falam mal dos seus "manuais de redação", mas, em que pesem seus excessos, eles trouxeram mais parâmetros de mais objetividade e mais olhar crítico para o repertório da imprensa. A Folha radicalizou corajosamente a sua própria transparência interna. Investiu com tudo na instituição do ombudsman. Adotou a pluralidade como regra e, ainda hoje, talvez seja o jornal que mais longe leva o princípio da pluralidade de opiniões – tanto que publica não apenas as cartas dos leitores que divergem agressivamente de seus editoriais como dá lugar à opinião dissidente de um de seus editores.
A Folha não é "a direita", como dizem. Ela publica também a direita, mas publica a esquerda e o centro: espelha o debate público na ebulição de suas esquisitices e de suas irregularidades. Nesse sentido, a Folha faz bem em não admitir que ninguém lhe diga o que ela deve fazer ou deixar de fazer. Ela ergue acima de tudo a bandeira de sua própria independência e, assim, realiza a razão de ser da imprensa e cumpre seu papel.

Uma briga desastrosa

O que assinalo aqui são fatos, não são opiniões. A democracia brasileira deve muito à Folha de S.Paulo e à conduta jornalística que ela adotou de 1984 para cá, pelo menos. Não reconhecer isso é um erro crasso. E perigoso. Repito: isso é história, são fatos transitados no curso do tempo. Temos de ter o mínimo de abertura intelectual para nos dar conta da dimensão desses fatos e extrair deles o seu devido sentido.
Por tudo isso, essa briga toda é um desastre. Vão perder com ela os intelectuais minimamente honestos e vai perder a Folha. A "Nota da Redação" contra Fábio Comparato e Maria Victória é um ponto fora da curva – e deveria ser tratada como tal. A adoção do termo "ditabranda" é um "palpite infeliz", no dizer de Fernando Barros e Silva – e deveria ser tratada como tal.
Para falar a verdade, quando li aquele editorial, eu nem fiquei tão abespinhado assim. Essa história de "ditabranda" soou, para mim, como um remake piorado de algo que dizíamos no movimento estudantil do meu tempo, num trocadilho que já me parecia meio pobre de imaginação: em vez de ditadura, falávamos "ditamole". Sem graça, por certo, mas era o que falávamos. Zombar da ditadura era um esporte estudantil bastante difundido naquela virada dos anos 1970 para os 80.
Em 1983, participei de uma chapa para o Centro Acadêmico "XI de Agosto", chamada "The Pravda" (que por acaso ganhou duas eleições seguidas), que se referia ao regime militar como "Remil". Era uma piada que fazíamos para espicaçar o que restava de rabugice autoritária naquele cadáver da ditadura e também de caçoar da mania de siglas tão difundida na administração federal. Era uma febre pavorosa, que, não por acaso, persiste até hoje. Brasília é a Meca das siglas, uma obsessão burocrática que atravessa os governos sem dar sinais de enfraquecimento. Siglas são sinônimos de eficiência administrativa num mundo sem administração democrática.
Mas agora, como já disse um leitor, parece que "o caldo entornou". De um lado e de outro, temos gente que tem razão brandindo argumentos sem razão. Sei que o alerta que lanço aqui não vai levar a nada. Sei que vou ser fuzilado pelos dois lados, como sói acontecer. Não importa. Digo que há mais em comum entre a história da Folha e a trajetória de Fábio Comparato e Maria Victória Benevides do que entre a Folha e a selvageria dos que agora jogam lenha nessa fogueira insensata. Um pouco de calma, um pouco de juízo, um pouco de humildade e as coisas teriam sido diferentes. Mas talvez seja tarde.
A fúria, assim como o furor, é uma emoção compreensível – mas a brandura talvez pudesse nos aconselhar um pouco. Entre nós foi sempre assim: a chegada do colonizador foi mais branda, a proclamação da independência passou lisa, a abolição da escravatura não nos custou uma guerra civil, a república brotou de meia dúzia de gritos... até a ditadura militar – por que não? – foi "menos pior" que outras, ainda que tenha sido infame e inaceitável. Será que só as nossas brigas irracionais precisam ser tão sanguinárias, tão incendiárias, tão alucinadamente inúteis?



* O autor é jornalista, professor da Escola de Comunicações e Artes e pesquisador do Instituto de Estudos Avançados da USP


Direito à Comunicação

Emissoras veiculam 10% de conteúdos locais


São Paulo (Observatório do Direito à Comunicação) - A regionalização da produção audiovisual é uma preocupação recorrente para estudiosos da comunicação, telespectadores, produtores independentes e gestores públicos. Tal é sua importância que o capítulo da Comunicação Social da Constituição Federal estabelece como princípios da produção e programação das emissoras de radiodifusão, em seu artigo 221, a “regionalização da produção cultural, artística, e jornalística”. Para medir a presença destes conteúdos na programação das emissoras de televisão, o Observatório do Direito à Comunicação realizou o estudo “Produção Regional na TV Aberta Brasileira.
A partir da análise de 58 emissoras em 11 capitais das cinco regiões brasileiras, a pesquisa chegou a um dado preocupante: apenas 10,83% do tempo veiculado é ocupado com conteúdos de origem local. O índice é bastante inferior ao percentual de 30% previsto no Projeto de Lei da ex-deputada Jandira Feghali (PcdoB-RJ) (256/1991), que visa regulamentar o dispositivo constitucional citado acima, tramitando no Congresso Nacional há 18 anos.
“O índice de 10% é extremamente baixo. Totalmente insuficiente para a quantidade e qualidade de matéria-prima que temos em termos de cultura popular local e regional e um sinal de como a produção, circulação e o consumo da cultura no país obedece a uma lógica vertical e antidemocrática”, avalia Rosário Pompéia, mestre em comunicação social, integrante do Centro de Cultura Luis Freire, de Olinda (PE), e pesquisadora do tema.
A emissora com maior tempo dedicado a conteúdos locais é a Paraná Educativa, sediada em Curitiba e vinculada ao governo do Paraná, que preenche 50% de sua grade com atrações produzidas naquela cidade. Em seguida vêm a TV Rondon, afiliada da Rede TV! em Cuiabá (MT), com 45%, a pública Rede Minas, com 34,32%, e as gaúchas TV Pampa, afiliada à RedeTV!, com 26,5%, e a também pública TVE RS, com 22,82%. Entre as 10 emissoras com melhor desempenho na análise, evidencia-se a presença das regiões Sul e Nordeste, com três televisões cada uma.

Emissoras públicas são as mais regionalizadas

Tais dados revelam a disparidade entre emissoras públicos e comerciais. As primeiras reservam, em média, 25,5% de sua grade para conteúdos realizados em suas cidades. Os destaques são as já citadas Paraná Educativa (50%), a Rede Minas (34,32%) e TVE RS (22,82%). Além destas, a TV Ceará e a TV Cultura do Pará também figuram entre as 10 primeiras, com índice de regionalização de 15,97% e 15,41%.
Já as redes comerciais ficam abaixo da média nacional, reservando a média de 9,14% de suas grades de programação para conteúdos locais. Para especialistas entrevistados na pesquisa, tal quadro é resultado dos condicionantes políticos e econômicos impostos pelo modelo centralizado de rede. Um problema dos contratos de afiliação é o tempo pré-estabelecido pelas cabeças para a produção regional. Outra dificuldade é o alto risco de retorno financeiro, que muitas vezes leva as emissoras a nem sequer preencher o pouco tempo permitido pelas cabeças.

Record tem o melhor desempenho


Entre as redes nacionais, o estudo registra o mais alto percentual na Rede Pública de TV organizada em torno da TV Brasil, com média de 25,55% de programação regionalizada. Entre as comerciais, o melhor desempenho foi o da RedeTV!, com 12,2%, seguida de perto pela Record, com 11,2%. Como o número de emissoras afiliadas à primeira rede foi consideravelmente menor do que o da segunda, a pesquisa conclui pelo melhor desempenho da rede do Bispo Edir Macedo.
A Rede CNT apresentou média de 9,12% de atrações locais, mas o desempenho também é relativizado pelo levantamento só ter analisado duas emissoras desta rede. Em seguida, praticamente empatados, estão SBT e a Rede Bandeirantes, com índices de 8,6% e 8,56%, respectivamente. Na última colocação está a mais poderosa organização de televisão do país, a Rede Globo, com média de 7%.

Jornalismo em alta, educativos e infantis em baixa

Dentre os conteúdos locais analisados, o estudo identificou maior presença do gênero jornalístico, que soma 464 horas e 7 minutos. O segundo gênero com maior presença é o entretenimento, com 79 horas e 10 minutos, seguido pelos programas esportivos, com 74 horas e 51 minutos, e os culturais, que totaliza 74 horas e 40 minutos. Enquanto os conteúdos voltados ao entretenimento são quase exclusivos das redes comerciais, as atrações culturais são veiculadas majoritariamente pelas televisões públicas.
O levantamento registrou a forte presença de programas de televendas e religiosos, que ocupam, respectivamente, 47 horas e 15 minutos e 28 horas e 30 minutos das grades das 58 TVs analisadas. Os conhecidos programas “policiais” somam 38 horas e 15 minutos. As atrações rurais, com temáticas relacionadas ao campo, tradicionais nos estados do Sul e Centro-Oeste, totalizam 16 horas e 12 minutos. O destaque negativo ficou com a baixíssima incidência de conteúdos educativos e infantis, com, respectivamente, 5 horas e 30 minutos e 4 horas e 30 minutos em um universo de quase 60 emissoras de TV.

Sul mais local

A região com melhor média de produções locais foi o Sul, com 13,92%. A tendência abrange as duas cidades pesquisadas, Porto Alegre e Curitiba. A segunda região com maior índice de regionalização é o Centro-Oeste, com 11,66%. No entanto, verifica-se um alto percentual nas emissoras de Cuiabá, contra um desempenho mais fraco em Brasília. A região Norte, embora a análise tenha se restringido à Belém, apresentou média de 9,1%.
O Nordeste, conhecido pela riqueza de suas manifestações culturais, ficou levemente abaixo da média nacional, com suas emissoras reservando 9,8% do tempo de suas grades para atrações realizadas nas próprias cidades. Em último lugar está a região mais rica do país, o Sudeste, com 9,19%. O resultado mostra que a presença de produções locais não está diretamente ligada ao peso dos mercados.

Alerta à sociedade

Apesar de utilizar uma amostra de 58 dentre as 421 geradoras de televisão existentes no país, o estudo “Produção Local na TV Aberta Brasileira” traz importantes elementos para entender a realidade da televisão brasileira. A julgar pela estrutura vertical das redes de televisão, a extensão de suas análises para todas as capitais ou para as geradoras no interior poderia certamente apresentar um quadro mais completo, mas dificilmente iria alterar radicalmente a evidência da desvalorização da cultural regional pelas emissoras de TV nacionais.
O percentual de 10,83%, mais do que um número, é um alerta. No ano de 2005, a Organização das Nações Unidas para a Ciência, Educação e Cultura (Unesco) aprovou a Convenção pela Proteção da Diversidade Cultural, afirmando a importância dos bens culturais serem tratados como patrimônio das diversas nações e dos variados segmentos no interior delas. Este projeto, no entanto, está distante de fazer parte da realidade do mais importante meio de comunicação do Brasil.


Sudeste decepciona

A regionalização da produção na televisão brasileira não depende e não é influenciada diretamente pelo tamanho dos mercados publicitários. Enquanto regiões com poucos anunciantes e índice potencial de consumo médio, como Sul e Centro-Oeste, apresentam as melhores médias de regionalização, o Sudeste, com os mais ricos anunciantes do país, têm as emissoras com menor presença de conteúdos locais.
Esta foi a principal conclusão do estudo “Produção Regional na TV Aberta Brasileira”, realizado a partir da análise de 58 emissoras em 11 capitais brasileiras [veja aqui]. Segundo a pesquisa, as TVs da região Sul ocupam 13,92% de suas grades com conteúdos realizados em suas cidades. A segunda região com maior índice de regionalização é a Centro-Oeste, que registrou média de 11,66%.
Na região Sul, o índice acima da média nacional foi puxado pelas duas emissoras públicas, TVE RS e Paraná Educativa, que veiculam, respectivamente, 22,82% e 50% de produção local em suas grades. Outro caso da região que se destaca é o da TV Pampa, que preenche 26,5% do tempo com atrações gaúchas.
No Centro-Oeste, o índice foi impulsionado pelo peculiar caso da TV Rondon, de Cuiabá, que ocupa 45% de sua grade com produções locais, majoritariamente religiosas e de televendas, uma vez que seis das nove emissoras analisadas em Cuiabá e Brasília dedicam menos de 10% do seu tempo para locais em sua grade. O destaque negativo fica com a SBT Brasília e Cidade Verde, da capital matogrossense, que registraram, respectivamente, 3% e 5,95%.
Já a região Norte, da qual foram pesquisadas as emissoras apenas de Belém, manteve praticamente a média nacional, com 9,91% de produção local em suas seis televisões. Os destaques positivos são a pública TV Cultura, com 15,41%, e a RBA, afiliada à Rede Bandeirantes, com 15,82%. Já o SBT Belém transmite 3,66% e a rede religiosa Boas Novas, 5,65%.

Poder de mercado e riqueza cultural sem influência

A Região Sudeste - que abrange os principais mercados de televisão do país, e, portanto, teria supostamente condições financeiras para sustentar uma política de regionalização mais forte de suas emissoras - teve o desempenho mais baixo, com média de 9,19% de regionalização. Das 11 emissoras analisadas nesta região, apenas duas veiculam mais do que a média nacional, Rede Minas (34,32%) e Record MG (12,5%).
O índice foi baixo pela pouca presença de conteúdo regional nas afiliadas da Rede TV no Rio e em Belo Horizonte, ambas com apenas 1,48% da grade nesta modalidade de programa. Uma razão para o índice da região mais rica do país é a força da programação das cabeças-de-rede, que terminam sendo retransmitidas em proporção maior do que no restante do país.
Se o poder de mercado não está diretamente relacionado à regionalização da produção, tampouco a diversidade de manifestações culturais influencia neste sentido. A região Nordeste, conhecida pela riqueza de suas várias culturas locais, teve índice abaixo da média nacional de 10,83%, com 9,8% do tempo de suas emissoras dedicado à produção local.
Dentre as 20 emissoras pesquisadas nesta região, foi possível constatar uma disparidade muito grande, com TVs com produção local razoável, como a afiliada do SBT no Ceará TV Jangadeiro (20,3%), a afiliada da Band em Recife TV Clube (13,78%) e a afiliada do SBT em Natal TV Ponta Negra (17,5%). Esta última, de propriedade da prefeita da cidade, Micarla de Souza, no entanto, chegou a esta marca com forte ocorrência de programas arrendados a igrejas e televendas. O destaque negativo foi as afiliadas da Rede TV em Fortaleza e Recife e a TV MTV Recife, que não veiculam um minuto sequer de produção local.

Diferentes realidades

Se observadas individualmente as cidades, é possível perceber realidades bem diferenciadas no país. A capital paranaense, Curitiba, foi a cidade com índice mais alto de regionalização, com 15,74%. O índice é puxado pela Paraná Educativa, que dedica 50% de seu tempo a conteúdos locais, bem como por experiências como as da Rede Paranaense de Comunicação, afiliada da Rede Globo, que preenche surpreendentes 12,99% de sua grade com atrações locais.
Cuiabá foi a segunda cidade com maior índice de localidade, com 14,38% das grades de suas emissoras ocupados por programas locais. O destaque positivo é o já citado caso da TV Rondon (Rede TV), que preenche 45% de sua grade com produções cuiabanas, seguida de longe pela TV Gazeta (Record), com 15,22%. As TVs Centro América (Globo) e Cidade Verde (SBT) equilibraram o índice, com cerca de 6% de conteúdo local inseridos em suas grades.
Belo Horizonte destaca-se em meio à baixa média do Sudeste, com 12% de regionalização. O índice foi garantido pela grande presença destes conteúdos na Rede Minas (34,32%), que compensou as escassas atrações locais na Rede TV MG (1,48%) e na Globo Belo Horizonte (5,9%). Em seguida vem Porto alegre, que registrou 11,77% de média. Embora tenha duas emissoras com altos índices, TVE RS e TV Pampa, as emissoras SBT Poa e Band RS, com, respectivamente, 1,78% e 3,57%.
Logo abaixo vem a capital baiana, Salvador, que atingiu índice pouco acima da média nacional, com 11% de produção local. O percentual foi sustentado pela TVE BA, com 14,78% de conteúdos locais na grade, e pela TV Itapoan (Record), com 12,50%. O índice foi garantido também pelo desempenho razoável das outras três emissoras com menos atrações locais, TV Bahia (Globo), TV Aratu (SBT) e Band Bahia, todas com mais de 9% das horas dedicadas a atrações produzidas em Salvador.
As emissoras de Fortaleza veiculam 11,2% de atrações locais. A média é resultado de uma situação díspar, com três emissoras com bons índices - Tv Jangadeiro (SBT) (20,3%), TV Ceará (15,97%) e TV Cidade Record (13,44%) – e duas com pouco espaço à produção local – TV Verdes Mares (Globo) (6%) e Rede TV Fortaleza (0%).
Natal manteve-se pouco acima da média nacioinal, com 10,74% de atrações locais. O destaque positivo foi a TV Ponta Negra, de propriedade da prefeita, Micarla de Souza. No entanto, o alto índice é resultado de intensa participação de shows religiosos e infomerciais de televendas que alugam espaço da emissora. Das quatro emissoras avaliadas (a TVU não disponibilizou sua grade de programação), duas mantiveram-se na média: Band Natal (9,82%) e Tropical (Record) (9,92%). O pior índice foi da afiliada da Rede Globo TV Cabugi (5,75%).
Uma das cidades com cultural local de maior prestígio no país, Recife obteve um dos índices mais baixos, com apenas 7% de horas dedicadas à produção local entre suas emissoras. O percentual é resultado do fato de duas emissoras, MTV Recife e Rede TV Recife, não terem nenhum programa realizado na capital pernambucana. Diferente de outras cidades, as afiliadas da Band, TV Clube, e do SBT, TV Jornal, dedicam mais tempo do que a média para atrações locais, 13,78% e 12.40%, respectivamente.
Brasília, a despeito de alimentar o restante do país como fonte de informações políticas, foi uma das cidades com pior desempenho, atingindo média de 6,61%. A única emissora que ultrapassou a média nacional foi a TV Brasília, de propriedade dos Diários Associados e do vice-governador do DF, Paulo Octávio, com 11% de conteúdos locais transmitidos. As demais emissoras, afiliadas das quatro maiores redes, mantêm índices piores: Record DF (8,48%), Globo (5,75%), Band (4,76%) e SBT (3%).
Já a capital carioca teve a média mais baixa, com 5,82%. Se a cidade é conhecida nacionalmente por conta da penetração de produções das cabeças-de-rede TV Globo e TV Brasil, o conteúdo voltado ao Rio das emissoras possui pouco espaço em suas grades, cujos destaques negativos são a Rede TV Rio e o SBT Rio, ambos com 1,48%.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Circo da Notícia

AUTOR & LEITOR


Isto também faz parte da notícia

Por Carlos Brickmann em 17/2/2009


Trata-se de um colunista importante, de um jornal importante. Um leitor lhe escreveu, educadamente, para expor sua opinião contrária à do jornalista a respeito da acumulação de reservas pelo Banco Central. O colunista criticava o volume das reservas; o leitor dizia que, agora (em função da crise econômica), se constatou que a acumulação de divisas valeu a pena. E elogiava, de passagem, a seriedade da equipe do Banco Central, criticada habitualmente pelo colunista.

A resposta veio duríssima: na opinião do jornalista, as reservas eram desnecessárias e caras. "E estúpidas, como as ratazanas neoliberais que infestam o BC". A opinião sobre as reservas, concorde-se ou não com ela, é prerrogativa do colunista; ele tem direito a achar o que quiser, e a dizer o que acha. Mas o insulto aos profissionais do BC, mesmo em carta privada, exigiria uma argumentação muito mais sólida do que o simples xingamento.

O leitor voltou a escrever, dizendo que a resposta o impressionara, por demonstrar falta de isenção e, em vez de avaliar os resultados da política do Banco Central, rotular seus profissionais "de forma leviana e preconceituosa".

O colunista voltou à carga, dizendo que o leitor certamente não era jornalista. Se fosse, estaria morrendo de dar risada com essa "isenção".

O jornalista deve ser honesto, deve buscar as várias faces da história. Dificilmente, embora sua tarefa seja procurar a isenção, conseguirá ser isento (tem opiniões, tem formação, tem idiossincrasias). Mas daí a dar risada da isenção vai uma enorme distância. E um jornalista, acima de tudo, deve evitar a burrice: por que agredir um leitor que lhe propõe civilizadamente uma troca de idéias?



Cadê a carne?

E onde é que o colunista foi buscar as informações acima? A resposta segue no padrão habitual dos meios de comunicação, hoje em dia: teve acesso a elas.



Lemos, adeus

João Baptista Lemos, 82 anos, 63 de jornalismo, morreu agora em fevereiro. Uma das lendas vivas da profissão, Lemos começou a trabalhar na imprensa comunista, logo depois da Segunda Guerra Mundial. Parou por uns tempos e foi jogar futebol no Radium de Mococa – que, em São Paulo, tinha a fama de pior time do estado. Goleiro é profissão difícil até em Seleção; no Radium, era impossível. Voltou então a São Paulo e ao jornalismo. Foi um dos redatores-chefes do lendário Grande Jornal Falado Tupi, dirigiu o jornalismo da TV Excelsior, foi chefe de Reportagem da Folha de S.Paulo, passou um longo tempo no grande Jornal do Brasil. Criou várias gerações de jornalistas (entre eles, por exemplo, José Nêumanne Pinto). Lemos deixou seis filhas, doze netos, uma bisneta.



Para ir atrás

Luís Nassif, em seu blog, dá pistas sobre alguns brasileiros que perderam dinheiro no Caso Madoff:

"O diretor de CRM de um grande portal, por exemplo, perdeu US$ 3.015.431,98 com Zeus-Madoff. Um ex-dirigente do Banco Santos tinha US$ 1.073.435,35 em sua conta. O diretor executivo de TI de uma empresa média de informática tinha fabulosos US$ 13.270.567,51. E uma funcionária de TI da Secretaria da Fazenda de São Paulo US$ 565.129,15."

É visível que Nassif sabe do que está falando, mas não tem como, neste momento, conseguir documentação sobre os casos. Cabe aos meios de comunicação, com equipes de reportagem e amplos recursos, ir atrás do tema e desvelar o que for possível. Será complicado: gente que tem esse volume de dinheiro aplicado no exterior tem também influência e conhecimentos, e fará tudo para impedir que suas histórias sejam divulgadas. Além disso, é muito provável que boa parte das aplicações não tenha sido declarada – outra confusão. Mais uma confusão? Uma funcionária pública, ou terceirizada, cheia de dinheiro – de onde saiu? Mas é um assunto que não pode ser jogado para debaixo do tapete.



O mundo como ele é

Marcos Hummel, grande jornalista, um dos melhores apresentadores de nossa TV, traz-nos uma história real, que mostra como os fatos podem ser apresentados das mais diversas maneiras.

Judy Wallman, pesquisadora americana de genealogia, montou sua árvore genealógica, e descobriu que seu tio-bisavô Remus Reid era também ancestral do senador Harry Reid, democrata de Nevada. O parente comum tinha sido condenado e enforcado por roubo de cavalos em Montana, em 1889. A única foto disponível de Remus Reid era a de seu enforcamento. No verso da foto, a inscrição:

"Remus Reid, ladrão de cavalos, preso na prisão do Território de Montana em 1885, fugiu em 1887, roubou o trem Montana Flyer por seis vezes. Localizado e preso por detetives da Agência Pinkerton, foi condenado e enforcado em 1889".

Judy Wallman enviou e-mail ao senador Harry Reid pedindo informações sobre o parente comum, sem mencionar o que havia descoberto. Recebeu a seguinte mensagem:

"Remus Reid foi um famoso vaqueiro no Território de Montana. Seu império comercial cresceu a ponto de incluir a aquisição de valiosos exemplares de cavalos de raça, bem como um íntimo e profícuo relacionamento com a Ferrovia de Montana. A partir de 1883 dedicou vários anos de sua vida ao serviço do governo estadual. Depois disso, licenciou-se para reiniciar seu relacionamento com a Ferrovia. Em 1887, foi o elemento fundamental em grande investigação conduzida pela famosa Agência de Detetives Pinkerton. Em 1889 veio a falecer durante importante cerimônia cívica realizada em sua homenagem, quando a plataforma sobre a qual estava cedeu logo após seu discurso."



Quando o governo acerta

É uma regra não-escrita, mas real: deve-se evitar ao máximo falar bem de governos, nos meios de comunicação. Há outra regra não-escrita, tão real quanto a primeira: notícia só é notícia quando ocorre na capital. Fora da capital, só se for mesmo uma notícia muito, muito ruim, tragédia pra ninguém botar defeito.

Talvez isso explique porque uma excelente notícia, por todos os pontos de vista, foi minimizada pela grande imprensa: porque mostra que uma boa administração, de uma cidade que não é capital (embora tenha o melhor Índice de Desenvolvimento Humano do país), pode resolver problemas que, na maior parte do Brasil, ainda são crônicos.

A cidade é São Caetano do Sul, na Grande São Paulo; seu prefeito, José Auricchio, do PTB, se reelegeu com quase 80% dos votos válidos, em grande parte por ter colocado a saúde pública para funcionar. A notícia: o sistema de saúde do município oferece cirurgia de redução do estômago para pessoas com obesidade mórbida, tudo de graça (em serviços particulares, só o médico cobra mais de R$ 10 mil, a que se acrescem auxiliar, anestesista, remédios e hospital).

A cirurgia de estômago gratuita não é para todos: apenas para quem corre risco de vida pelo excesso de peso. Quem quiser operar-se por questões estéticas não será atendido. O tratamento não se limita à operação: o paciente é acompanhado por uma equipe multidisciplinar, com médico, nutricionista, psicólogo, fisioterapeuta, até que adquira novos hábitos de vida. E não é preciso pedir, nem esperar: a porta de entrada do sistema, a UBS, Unidade Básica de Saúde, pode indicar a operação mesmo a pessoas que não saibam que a oportunidade existe, desde que seja o caso de cirurgia.

E a grande imprensa? Parece mais preocupada em saber quem vai para qual partido. Deve haver boas notícias desse tipo pelo país afora que a gente não fica sabendo, porque os meios de comunicação não se preocupam com elas. Quem se importa com a vida e a morte dos consumidores de notícias?



Como...

A notícia sobre o assassínio da amante de um cavalheiro saiu num jornal importante (e é um colar de pedras preciosas):

"Segundo o delegado, o suspeito se mostrou arrependido do que fez (...) Apesar disso, o suspeito foi indiciado por homicídio qualificado por motivo fútil (...) O corpo da vítima ficou cinco dias no freezer sem que ninguém percebesse, embora várias pessoas tenham participado de um culto evangélico na casa".

1. "O suspeito se mostrou arrependido do que fez" – ou seja, ele mesmo já informou que não é suspeito, é o autor.

2. "Apesar disso, o suspeito foi indiciado (...)" – que coisa terrível! Mesmo estando arrependido, só porque matou a amante foi indiciado!

3. O que é que tem a ver o culto evangélico na casa com o corpo no freezer?



...é...


De um portal noticioso ligado a um grande jornal:

** "Eutanásia: médico diz que italiana está `ótima´"

Trata-se do caso Eluana, na Itália, em que a Justiça autorizou os médicos a desligar as máquinas que mantinham a moça viva, em estado vegetativo, há 17 anos. O título foi dado pouco antes da morte de Eluana.



...mesmo?

De um grande jornal, respeitado em todo o país:

** "Ex-espião russo aposta: EUA vão se desintegrar"

Logo abaixo, o subtítulo:

** "Confira a teoria de Igor Panarin, que previu colapso da Rússia em 1998"

Previsão assim não deve ser difícil, considerando-se que a União Soviética se desfez em 1989.



E eu com isso?

O caro colega fica se preocupando com coisas bobas – por exemplo, como é que um sujeito que só fala espanhol fica preso sete meses numa cadeia de São Paulo, dizendo que é mineiro, e os carcereiros acreditam – enquanto há fatos muito mais palpitantes acontecendo no mundo. Um bom exemplo:

** "Rua ganha nome de `Bulevar Consolo´após moradores encontrarem vibradores"

É o "Dildo Boulevard", em Darwin, na Austrália. E não é apelido, não: parece que a mudança de nome é oficial.

** "Luciano Huck, Angélica e filhos flagrados em Angra"

Que estariam fazendo para motivar o flagrante?

** "Taís Araújo passeia com os pais em shopping"

** "Reynaldo Gianecchini e Marcos Mion curtem balada juntos"

E não é nada do que você está pensando, caro colega. Já pensou que tremenda notícia, se isso que está em sua cabeça maliciosa fosse verdade?

** "Beyoncé vai a evento beneficente sem fazer as unhas"

** "Tailândia promove primeira corrida internacional de camas"



O grande título

Ah, a pressão do espaço! É isso que provoca títulos como este:

** "Viúva da Mega-Sena presta depoimento"

Ou este:

** "Viúva do 11 de Setembro está entre as vítimas"

Lembrando certa campanha eleitoral, das mais rumorosas, o 11 de Setembro e a Mega-Sena tinham filhos? Eram casados?

Ah, a pressão do tempo! É isso que provoca títulos como este:

** "Polícia vai investigar de queda de elevador em SP"


Ou como este, o grande título da semana:

** "Nossa Caixa R$ 4 bi a compra de usados"

Legal! Isso quer dizer que há mais crédito? Que o crédito foi reduzido? Que os preços baixaram? Que os preços subiram?

* O autor é Jornalista, diretor da Brickmann&Associados

Governo do Estado faz diagnóstico da área social de Rondônia

O Governo do Estado está fazendo um diagnóstico da área social em todo estado de Rondônia. O levantamento é coordenado pela secretária de Assistência Social do Estado, Tânia Pires, que para realizar o trabalho visitará todos os municípios rondonienses. Ela já esteve em Ji-Paraná, Ariquemes, Monte Negro, Nova Mamoré e Guajará-Mirim.
Durante a estada em cada cidade, a titular da Seas se reúne com o secretário da área social, mantém audiência com o prefeito ou com o seu vice, caso seja necessário, além da primeira-dama do Município, quando a mesma participa da administração.
“Um atendimento eficaz à população resulta de atuação articulada entre as três esferas: municipal, estadual e federal em parceria com a sociedade civil”, acredita Tânia Pires, que acaba de tomar outra providência inovadora com o objetivo de expandir o raio de atuação da pasta pela qual responde. “Em cada município pólo a Seas terá um representante”.
Questionada sobre a agenda que está cumprindo no Estado, justifica que o diálogo pessoalmente com os gestores municipais é relevante porque estreita as parcerias. “Cada secretário deve saber o mapa da sua área de atuação porque atuamos tecnicamente”, defende Tânia Pires, que sempre está acompanhada pela sua assessoria técnica.
Além de participar de reuniões com os representantes do poder público municipal, a secretária visita associações, entidades filantrópicas, entre outras instituições que atuam na assistência social.
A iniciativa do Governo do Estado em fortalecer as parcerias com as prefeituras registra um saldo positivo. A secretária de Nova Mamoré Mairla Brasileiro Abreu, por exemplo, está entusiasmada com a proposta. “Antes nós sentíamos a ausência do Estado nas nossas ações, agora estamos muito confiantes,” comemora.
“Esse nosso trabalho integra a pauta que o governador Ivo Cassol estabeleceu, visando o bem - estar da população rondoniense” esclarece a titular da Seas. Nessa missão, ela conta com o apoio da primeira – dama do Estado, Ivone Cassol, que além de presidir a União dos Voluntários do Estado de Rondônia, coordena importantes ações de cunho social do Governo do Estado.




JARBAS NA VEJA

Muito barulho por nada

Por Luciano Martins Costa em 17/2/2009

Comentário para o programa radiofônico do OI, 17/2/2009

O senador pernambucano Jarbas Vasconcelos volta às páginas da imprensa, mas se nega a dar nomes aos bois. Sua acusação de que o PMDB, seu próprio partido, busca o poder apenas para se beneficiar da corrupção, não causou o impacto que se poderia esperar. A cúpula do partido distribuiu nota oficial, de apenas cinco linhas, quase lacônica, dizendo que as críticas de Vasconcelos foram apenas um desabafo, e que não atingiram ninguém em especial.
O PMDB não assinou recibo, o acusador evita aprofundar as denúncias, mas parte da imprensa se movimentou.
O Estado de S.Paulo e o Globo fizeram um pequeno esforço de reportagem e trazem em suas páginas alguns nomes de peemedebistas com problemas na Justiça. Segundo o Globo, oito dos dezenove senadores do maior partido do país respondem a inquéritos ou ações penais no Supremo Tribunal Federal. Isso equivale a dizer que 40% dos senadores do partido com a maior bancada são investigados por crimes como corrupção, formação de quadrilha, falsidade ideológica, lavagem de dinheiro, compra de votos e sonegação fiscal.
O Globo completa o quadro sobre o PMDB observando que o partido vai controlar neste ano uma fatia de 151 bilhões de reais do queijo do orçamento federal.

Apenas uma declaração

O Estadão vai além, dizendo que dez dos dezenove senadores do PMDB, ou mais de 50% da bancada, incluindo os líderes do partido e do governo, respondem a processos ou são investigados. No total, observa o jornal paulista, foram encontrados nos arquivos do STF treze inquéritos, quatro ações penais e cinco investigações contra senadores peemedebistas.
Ou seja, se desejasse mesmo produzir mais do que uma mera declaração, o senador Jarbas Vasconcelos poderia orientar um de seus assessores a fazer o que fizeram os jornais – e apontar nomes. Mas ele sabe que não pode citar nenhum de seus colegas enquanto são apenas investigados ou estão sendo processados.
No entender do Supremo Tribunal Federal, todos eles são inocentes até que tenham esgotado todos os infinitos recursos que a lei coloca à disposição para quem pode se defender. Assim, na prática e sob o rigor da lei, nenhum dos oito ou dez senadores do PMDB é corrupto.
Portanto, a entrevista do senador Jarbas Vaconcelos à revista Veja continua sendo apenas uma declaração. Um factóide.

***

O jogo do faz de conta

Para produzir algum efeito, se realmente tem intenção de colocar sob controle os desmandos do Congresso Nacional e colaborar para reduzir o nível de corrupção, a imprensa precisa se aliar aos parlamentares com ficha limpa e questionar o constante adiamento de reformas que poderiam eliminar o mal pela raiz.
Como se sabe, tudo começa no registro eleitoral, e o Supremo Tribunal Federal decidiu, no ano passado, que cidadãos com ficha suja só podem ser impedidos de registrar candidatura a cargo eletivo depois de condenados definitivamente.
Se se trata, então, de alertar o eleitor para ter em mente os nomes de parlamentares suspeitos e negar a eles seu voto, a lista ainda está incompleta. Faltam os nomes dos deputados acusados ou processados. E não apenas do PMDB.

Só um factóide

O PMDB apenas se tornou o assunto da vez porque possui as maiores bancadas de parlamentares e o maior número de prefeitos. É uma força política definidora de eleições e não possui uma liderança nacional. Declarações genéricas contra integrantes do partido serão sempre colocadas na conta da disputa pela sucessão presidencial de 2010.
Se o senador Vasconcelos e a imprensa estivessem mesmo dispostos a colocar a nu a corrupção do Congresso, deveriam estender seus olhares para os demais partidos, e para a Câmara dos Deputados, onde brilham luminares como Edmar Moreira, o senhor do castelo, e outros suspeitos mais discretos.
Lembre-se o leitor que Edmar Moreira chegou a ser nomeado corregedor da Câmara dos Deputados. Quem o nomeou tinha claramente a intenção de garantir que a Corregedoria não iria funcionar.
Qualquer investigação séria sobre corrupção no Congresso deveria começar por aí. Declarações bombásticas, mas genéricas, apenas aumentam o descrédito da sociedade em relação ao Parlamento. Muito barulho por nada.