sexta-feira, 6 de março de 2009

Direito à Comunicação

Emissoras veiculam 10% de conteúdos locais


São Paulo (Observatório do Direito à Comunicação) - A regionalização da produção audiovisual é uma preocupação recorrente para estudiosos da comunicação, telespectadores, produtores independentes e gestores públicos. Tal é sua importância que o capítulo da Comunicação Social da Constituição Federal estabelece como princípios da produção e programação das emissoras de radiodifusão, em seu artigo 221, a “regionalização da produção cultural, artística, e jornalística”. Para medir a presença destes conteúdos na programação das emissoras de televisão, o Observatório do Direito à Comunicação realizou o estudo “Produção Regional na TV Aberta Brasileira.
A partir da análise de 58 emissoras em 11 capitais das cinco regiões brasileiras, a pesquisa chegou a um dado preocupante: apenas 10,83% do tempo veiculado é ocupado com conteúdos de origem local. O índice é bastante inferior ao percentual de 30% previsto no Projeto de Lei da ex-deputada Jandira Feghali (PcdoB-RJ) (256/1991), que visa regulamentar o dispositivo constitucional citado acima, tramitando no Congresso Nacional há 18 anos.
“O índice de 10% é extremamente baixo. Totalmente insuficiente para a quantidade e qualidade de matéria-prima que temos em termos de cultura popular local e regional e um sinal de como a produção, circulação e o consumo da cultura no país obedece a uma lógica vertical e antidemocrática”, avalia Rosário Pompéia, mestre em comunicação social, integrante do Centro de Cultura Luis Freire, de Olinda (PE), e pesquisadora do tema.
A emissora com maior tempo dedicado a conteúdos locais é a Paraná Educativa, sediada em Curitiba e vinculada ao governo do Paraná, que preenche 50% de sua grade com atrações produzidas naquela cidade. Em seguida vêm a TV Rondon, afiliada da Rede TV! em Cuiabá (MT), com 45%, a pública Rede Minas, com 34,32%, e as gaúchas TV Pampa, afiliada à RedeTV!, com 26,5%, e a também pública TVE RS, com 22,82%. Entre as 10 emissoras com melhor desempenho na análise, evidencia-se a presença das regiões Sul e Nordeste, com três televisões cada uma.

Emissoras públicas são as mais regionalizadas

Tais dados revelam a disparidade entre emissoras públicos e comerciais. As primeiras reservam, em média, 25,5% de sua grade para conteúdos realizados em suas cidades. Os destaques são as já citadas Paraná Educativa (50%), a Rede Minas (34,32%) e TVE RS (22,82%). Além destas, a TV Ceará e a TV Cultura do Pará também figuram entre as 10 primeiras, com índice de regionalização de 15,97% e 15,41%.
Já as redes comerciais ficam abaixo da média nacional, reservando a média de 9,14% de suas grades de programação para conteúdos locais. Para especialistas entrevistados na pesquisa, tal quadro é resultado dos condicionantes políticos e econômicos impostos pelo modelo centralizado de rede. Um problema dos contratos de afiliação é o tempo pré-estabelecido pelas cabeças para a produção regional. Outra dificuldade é o alto risco de retorno financeiro, que muitas vezes leva as emissoras a nem sequer preencher o pouco tempo permitido pelas cabeças.

Record tem o melhor desempenho


Entre as redes nacionais, o estudo registra o mais alto percentual na Rede Pública de TV organizada em torno da TV Brasil, com média de 25,55% de programação regionalizada. Entre as comerciais, o melhor desempenho foi o da RedeTV!, com 12,2%, seguida de perto pela Record, com 11,2%. Como o número de emissoras afiliadas à primeira rede foi consideravelmente menor do que o da segunda, a pesquisa conclui pelo melhor desempenho da rede do Bispo Edir Macedo.
A Rede CNT apresentou média de 9,12% de atrações locais, mas o desempenho também é relativizado pelo levantamento só ter analisado duas emissoras desta rede. Em seguida, praticamente empatados, estão SBT e a Rede Bandeirantes, com índices de 8,6% e 8,56%, respectivamente. Na última colocação está a mais poderosa organização de televisão do país, a Rede Globo, com média de 7%.

Jornalismo em alta, educativos e infantis em baixa

Dentre os conteúdos locais analisados, o estudo identificou maior presença do gênero jornalístico, que soma 464 horas e 7 minutos. O segundo gênero com maior presença é o entretenimento, com 79 horas e 10 minutos, seguido pelos programas esportivos, com 74 horas e 51 minutos, e os culturais, que totaliza 74 horas e 40 minutos. Enquanto os conteúdos voltados ao entretenimento são quase exclusivos das redes comerciais, as atrações culturais são veiculadas majoritariamente pelas televisões públicas.
O levantamento registrou a forte presença de programas de televendas e religiosos, que ocupam, respectivamente, 47 horas e 15 minutos e 28 horas e 30 minutos das grades das 58 TVs analisadas. Os conhecidos programas “policiais” somam 38 horas e 15 minutos. As atrações rurais, com temáticas relacionadas ao campo, tradicionais nos estados do Sul e Centro-Oeste, totalizam 16 horas e 12 minutos. O destaque negativo ficou com a baixíssima incidência de conteúdos educativos e infantis, com, respectivamente, 5 horas e 30 minutos e 4 horas e 30 minutos em um universo de quase 60 emissoras de TV.

Sul mais local

A região com melhor média de produções locais foi o Sul, com 13,92%. A tendência abrange as duas cidades pesquisadas, Porto Alegre e Curitiba. A segunda região com maior índice de regionalização é o Centro-Oeste, com 11,66%. No entanto, verifica-se um alto percentual nas emissoras de Cuiabá, contra um desempenho mais fraco em Brasília. A região Norte, embora a análise tenha se restringido à Belém, apresentou média de 9,1%.
O Nordeste, conhecido pela riqueza de suas manifestações culturais, ficou levemente abaixo da média nacional, com suas emissoras reservando 9,8% do tempo de suas grades para atrações realizadas nas próprias cidades. Em último lugar está a região mais rica do país, o Sudeste, com 9,19%. O resultado mostra que a presença de produções locais não está diretamente ligada ao peso dos mercados.

Alerta à sociedade

Apesar de utilizar uma amostra de 58 dentre as 421 geradoras de televisão existentes no país, o estudo “Produção Local na TV Aberta Brasileira” traz importantes elementos para entender a realidade da televisão brasileira. A julgar pela estrutura vertical das redes de televisão, a extensão de suas análises para todas as capitais ou para as geradoras no interior poderia certamente apresentar um quadro mais completo, mas dificilmente iria alterar radicalmente a evidência da desvalorização da cultural regional pelas emissoras de TV nacionais.
O percentual de 10,83%, mais do que um número, é um alerta. No ano de 2005, a Organização das Nações Unidas para a Ciência, Educação e Cultura (Unesco) aprovou a Convenção pela Proteção da Diversidade Cultural, afirmando a importância dos bens culturais serem tratados como patrimônio das diversas nações e dos variados segmentos no interior delas. Este projeto, no entanto, está distante de fazer parte da realidade do mais importante meio de comunicação do Brasil.


Sudeste decepciona

A regionalização da produção na televisão brasileira não depende e não é influenciada diretamente pelo tamanho dos mercados publicitários. Enquanto regiões com poucos anunciantes e índice potencial de consumo médio, como Sul e Centro-Oeste, apresentam as melhores médias de regionalização, o Sudeste, com os mais ricos anunciantes do país, têm as emissoras com menor presença de conteúdos locais.
Esta foi a principal conclusão do estudo “Produção Regional na TV Aberta Brasileira”, realizado a partir da análise de 58 emissoras em 11 capitais brasileiras [veja aqui]. Segundo a pesquisa, as TVs da região Sul ocupam 13,92% de suas grades com conteúdos realizados em suas cidades. A segunda região com maior índice de regionalização é a Centro-Oeste, que registrou média de 11,66%.
Na região Sul, o índice acima da média nacional foi puxado pelas duas emissoras públicas, TVE RS e Paraná Educativa, que veiculam, respectivamente, 22,82% e 50% de produção local em suas grades. Outro caso da região que se destaca é o da TV Pampa, que preenche 26,5% do tempo com atrações gaúchas.
No Centro-Oeste, o índice foi impulsionado pelo peculiar caso da TV Rondon, de Cuiabá, que ocupa 45% de sua grade com produções locais, majoritariamente religiosas e de televendas, uma vez que seis das nove emissoras analisadas em Cuiabá e Brasília dedicam menos de 10% do seu tempo para locais em sua grade. O destaque negativo fica com a SBT Brasília e Cidade Verde, da capital matogrossense, que registraram, respectivamente, 3% e 5,95%.
Já a região Norte, da qual foram pesquisadas as emissoras apenas de Belém, manteve praticamente a média nacional, com 9,91% de produção local em suas seis televisões. Os destaques positivos são a pública TV Cultura, com 15,41%, e a RBA, afiliada à Rede Bandeirantes, com 15,82%. Já o SBT Belém transmite 3,66% e a rede religiosa Boas Novas, 5,65%.

Poder de mercado e riqueza cultural sem influência

A Região Sudeste - que abrange os principais mercados de televisão do país, e, portanto, teria supostamente condições financeiras para sustentar uma política de regionalização mais forte de suas emissoras - teve o desempenho mais baixo, com média de 9,19% de regionalização. Das 11 emissoras analisadas nesta região, apenas duas veiculam mais do que a média nacional, Rede Minas (34,32%) e Record MG (12,5%).
O índice foi baixo pela pouca presença de conteúdo regional nas afiliadas da Rede TV no Rio e em Belo Horizonte, ambas com apenas 1,48% da grade nesta modalidade de programa. Uma razão para o índice da região mais rica do país é a força da programação das cabeças-de-rede, que terminam sendo retransmitidas em proporção maior do que no restante do país.
Se o poder de mercado não está diretamente relacionado à regionalização da produção, tampouco a diversidade de manifestações culturais influencia neste sentido. A região Nordeste, conhecida pela riqueza de suas várias culturas locais, teve índice abaixo da média nacional de 10,83%, com 9,8% do tempo de suas emissoras dedicado à produção local.
Dentre as 20 emissoras pesquisadas nesta região, foi possível constatar uma disparidade muito grande, com TVs com produção local razoável, como a afiliada do SBT no Ceará TV Jangadeiro (20,3%), a afiliada da Band em Recife TV Clube (13,78%) e a afiliada do SBT em Natal TV Ponta Negra (17,5%). Esta última, de propriedade da prefeita da cidade, Micarla de Souza, no entanto, chegou a esta marca com forte ocorrência de programas arrendados a igrejas e televendas. O destaque negativo foi as afiliadas da Rede TV em Fortaleza e Recife e a TV MTV Recife, que não veiculam um minuto sequer de produção local.

Diferentes realidades

Se observadas individualmente as cidades, é possível perceber realidades bem diferenciadas no país. A capital paranaense, Curitiba, foi a cidade com índice mais alto de regionalização, com 15,74%. O índice é puxado pela Paraná Educativa, que dedica 50% de seu tempo a conteúdos locais, bem como por experiências como as da Rede Paranaense de Comunicação, afiliada da Rede Globo, que preenche surpreendentes 12,99% de sua grade com atrações locais.
Cuiabá foi a segunda cidade com maior índice de localidade, com 14,38% das grades de suas emissoras ocupados por programas locais. O destaque positivo é o já citado caso da TV Rondon (Rede TV), que preenche 45% de sua grade com produções cuiabanas, seguida de longe pela TV Gazeta (Record), com 15,22%. As TVs Centro América (Globo) e Cidade Verde (SBT) equilibraram o índice, com cerca de 6% de conteúdo local inseridos em suas grades.
Belo Horizonte destaca-se em meio à baixa média do Sudeste, com 12% de regionalização. O índice foi garantido pela grande presença destes conteúdos na Rede Minas (34,32%), que compensou as escassas atrações locais na Rede TV MG (1,48%) e na Globo Belo Horizonte (5,9%). Em seguida vem Porto alegre, que registrou 11,77% de média. Embora tenha duas emissoras com altos índices, TVE RS e TV Pampa, as emissoras SBT Poa e Band RS, com, respectivamente, 1,78% e 3,57%.
Logo abaixo vem a capital baiana, Salvador, que atingiu índice pouco acima da média nacional, com 11% de produção local. O percentual foi sustentado pela TVE BA, com 14,78% de conteúdos locais na grade, e pela TV Itapoan (Record), com 12,50%. O índice foi garantido também pelo desempenho razoável das outras três emissoras com menos atrações locais, TV Bahia (Globo), TV Aratu (SBT) e Band Bahia, todas com mais de 9% das horas dedicadas a atrações produzidas em Salvador.
As emissoras de Fortaleza veiculam 11,2% de atrações locais. A média é resultado de uma situação díspar, com três emissoras com bons índices - Tv Jangadeiro (SBT) (20,3%), TV Ceará (15,97%) e TV Cidade Record (13,44%) – e duas com pouco espaço à produção local – TV Verdes Mares (Globo) (6%) e Rede TV Fortaleza (0%).
Natal manteve-se pouco acima da média nacioinal, com 10,74% de atrações locais. O destaque positivo foi a TV Ponta Negra, de propriedade da prefeita, Micarla de Souza. No entanto, o alto índice é resultado de intensa participação de shows religiosos e infomerciais de televendas que alugam espaço da emissora. Das quatro emissoras avaliadas (a TVU não disponibilizou sua grade de programação), duas mantiveram-se na média: Band Natal (9,82%) e Tropical (Record) (9,92%). O pior índice foi da afiliada da Rede Globo TV Cabugi (5,75%).
Uma das cidades com cultural local de maior prestígio no país, Recife obteve um dos índices mais baixos, com apenas 7% de horas dedicadas à produção local entre suas emissoras. O percentual é resultado do fato de duas emissoras, MTV Recife e Rede TV Recife, não terem nenhum programa realizado na capital pernambucana. Diferente de outras cidades, as afiliadas da Band, TV Clube, e do SBT, TV Jornal, dedicam mais tempo do que a média para atrações locais, 13,78% e 12.40%, respectivamente.
Brasília, a despeito de alimentar o restante do país como fonte de informações políticas, foi uma das cidades com pior desempenho, atingindo média de 6,61%. A única emissora que ultrapassou a média nacional foi a TV Brasília, de propriedade dos Diários Associados e do vice-governador do DF, Paulo Octávio, com 11% de conteúdos locais transmitidos. As demais emissoras, afiliadas das quatro maiores redes, mantêm índices piores: Record DF (8,48%), Globo (5,75%), Band (4,76%) e SBT (3%).
Já a capital carioca teve a média mais baixa, com 5,82%. Se a cidade é conhecida nacionalmente por conta da penetração de produções das cabeças-de-rede TV Globo e TV Brasil, o conteúdo voltado ao Rio das emissoras possui pouco espaço em suas grades, cujos destaques negativos são a Rede TV Rio e o SBT Rio, ambos com 1,48%.

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