A secura e a platitude da capital federal, somados à boa
dose de esquizofrenia, devem ser responsáveis por isso.
*Por Mara Paraguassu
O chororô de 40 minutos e as preces invocadas a um Deus enxovalhado quando o assunto é fazer traquinagem com dinheiro público surtiram efeito. Natan Donadon, condenado a 13 anos de prisão por peculato e formação de quadrilha, em decisão transitada em julgado, escapou da cassação.
Pouco mais de uma centena de Excelências se lixaram para a população. Já 233 votaram com o relatório do deputado Sergio Zveiter (PSD-RJ), que declarou absolutamente incompatível com a atividade parlamentar a “condenação de natureza gravíssima” estabelecida pelo STF. Faltaram 24 votos para expurgar Natan do parlamento.
Com esse resultado, o voto secreto se revela insustentável. O diabos é que enquanto a votação aberta e sem máscara não acontece, as maçãs boas misturadas com as maças podres no cesto da representação popular pagarão o pato.
As eleições vêm aí, e duvido que o eleitor vai acreditar que a Excelência A ou B votou pela perda de mandato do deputado prisioneiro, mais um que posou de vítima na deprimente noite de terça-feira.
Atacou a imprensa, o que todo político acuado faz, relatou as agruras da existência na prisão e a infelicidade de contar com uma Carmem Lúcia no meio do caminho, descobrindo que presídios não tem chuveiro quente e água nem sempre.
Como é possível manter o mandato de alguém preso há dois meses na Papuda, em Brasília, transportado à Câmara algemado e num camburão? A secura e a platitude da capital federal, somados à boa dose de esquizofrenia, devem ser responsáveis por isso. Resultado: o escárnio predomina.
Dane-se o povo e a Câmara dos Deputados: parlamentares como Natan Donadon e os que o elegeram doravante representante dos presidiários ao manter seu mandato não estão mesmo nem aí para a instituição.
No fim de tudo, talvez para evitar uma Câmara dos Deputados mais nanica do que no começo da noite, o presidente, deputado Henrique Alves, de certa forma desaprovou a decisão soberana do plenário: declarou Natan Donadon afastado das funções e disse que o substituto assumirá imediatamente.
Se ninguém entendeu o que foi isso, não me pergunte.
Passa da meia-noite e pergunto aos meus botões: foi para assistir a esse espetáculo da falsa democracia que se resiste à perda automática de mandato em casos como esse? Será que Alves combinou tal saída com Donadon, seu ex-colega do PMDB, para que possa recorrer e exercer um mandato original, com gabinete na Papuda, afinal escapou da cassação? Ou para que possa deixar a Papuda, já que um deputado com mandato (ele não foi cassado) não pode ficar preso, conforme diz a Constituição? É a Câmara cutucando o STF?
Triste, muito triste.
* Mara Paraguassu é jornalista
Email: maraparaguassu@amazoniadagente.com.br
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