quinta-feira, 10 de julho de 2008

Jornal de Debates

INGRID BETANCOURT LIVRE

“Lenin, acorde, eles ficaram loucos!”

* Alberto Dines

Em 21 de agosto de 1968, quando o Kremlin resolveu enviar os seus tanques para encerrar a Primavera de Praga, os estudantes tchecos saíram à rua para protestar. Conforme conta Jan Puhl no Der Spiegel, alguns picharam num muro os seguintes dizeres: "Lenin, acorde, eles ficaram loucos!"
A condenação de Fidel Castro aos seqüestros cruéis e anti-revolucionários praticados pelas FARC relembra os 40 anos do levante tcheco e sugere uma nova pichação: "Lenin, acorde, eles continuam loucos!".
"Eles" não são apenas as FARC, são também a mídia dita "progressista e antiimperialista" ainda encarapitada num imaginário Muro de Berlim policiado pela Stasi. "Eles" também são a mídia dita liberal, cada vez menos livre.
Jornalistas, em geral, funcionam como radares dos novos tempos, barômetros que antecipam mudanças, drásticas ou graduais. Barack Obama, pós-racial e pós-ideológico, desconcertou os fundamentalistas de direita e esquerda porque a mídia americana e a internacional – uma realimentando a outra – continuam presas aos dilemas e esquemas da Guerra Fria, incapazes de perceber que jornais saem todos os dias e todos os dias algo se move. Jornalistas fazem jornais, porém não lêem jornais – no máximo aqueles em que trabalham.
Ingrid Betancourt pulou do helicóptero que a trouxe da selva com um repertório audacioso de idéias, como se os seis anos que passou acorrentada não tivessem acontecido, como se acabasse de sair de um seminário sobre a agenda do futuro.
A cada dia dispara uma idéia desconcertante, sensacional, tirada de uma cartilha de convergências, onde há lugar para todos. Excluída da vida durante um lapso tão grande vingou-se: excluiu a exclusão.

Torta e mal-explicada

No primeiro dia deu luz verde para o terceiro mandato de Álvaro Uribe, no dia seguinte estimulou o presidente equatoriano a esquecer zangas e trabalhar pela paz regional. Na segunda-feira (7/7) foi em frente e declarou que Hugo Chávez é indispensável para um diálogo com as FARC. [Em tempo: e na terça-feira (8/7), afirmou que "é preciso conversar até com as pessoas que odiamos".]
Ingrid parece disposta a abrir todos os cadeados, quebrar todos os engessamentos, liquidar todos os preconceitos. Tem, evidentemente, um projeto, talvez um projeto político. Mas por enquanto dá vazão a um projeto intelectual, engenhosa mistura de utopismo sul-americano com cartesianismo francês: como as ideologias não conseguiram evitar as sucessivas catástrofes do nazi-fascismo, do stalinismo e a próxima, ambiental-alimentar, melhor aposentá-las.
Parafraseando Clemenceau (o mancheteiro do "J’Accuse", ver abaixo), "a vida é séria demais para ser comandada por frases-feitas". Frases feitas que políticos midiáticos e midiáticos politizados inventam todos os dias para preencher as páginas em branco.
Ainda há muita coisa obscura, torta e mal-explicada na história da milagrosa libertação da refém das FARC. No entanto, sua extraordinária recuperação com apenas seis dias de liberdade não nos impede de refletir sobre a carência crucial do nosso tempo: a falta de fabulistas e fabuladores. Em plena Era da Informação percebemos que o que falta realmente é imaginação.
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Georges Clemenceau, político e jornalista, redator-chefe do L´Aurore quando Emile Zola lhe entregou a carta-aberta ao presidente da República Francesa denunciando a injustiça contra o capitão Alfred Dreyfus. Com ela produziu a mais conhecida manchete de todos os tempos (13/1/1898). Quatro anos antes, dissera que Dreyfus era uma "alma imunda". Ao assumir o comando das forças francesas no fim da 1ª Guerra Mundial escreveu: "A guerra é coisa séria demais para ser entregue aos generais".















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